Senhor Presidente da Assembleia da República,
Senhor Primeiro-Ministro,
Senhor Presidente da Câmara Municipal do Porto,
Senhor Presidente da Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República,
Militares,
Senhoras e Senhores,
Saúdo, calorosamente, a cidade do Porto e as suas gentes, de quem Miguel Torga dizia:
“Quem morre pela liberdade todos os séculos, é capaz dos mais espontâneos entusiasmos cívicos.”
Na madrugada de 31 de Janeiro de 1891, os portuenses ergueram-se, percorrendo com entusiasmo patriótico estas ruas e estas praças dispostos a todos os sacrifícios por um ideal cívico.
Acontecimentos internacionais recentes tinham revelado as fragilidades do Portugal da altura. Um republicano ilustre, João Chagas, afirmou a propósito: “... fez-se, de súbito, a verdade sobre as coisas do Estado.”
Animados pelo ideal da razão, aqueles homens generosos buscavam uma resposta para os impasses de que Portugal sofria.
A revolta fracassou então, mas deixou sementes que frutificariam duas décadas mais tarde, com a instauração da República, em Outubro de 1910. A República cujo centenário começamos hoje mesmo a comemorar.
É tempo de recordar. Decorridos cem anos, sumidas as exaltações, passados os antagonismos, eis o momento oportuno para exercer a arte da memória.
Podemos agora ser justos para sopesar as esperanças e as realizações. Graças à distância de um século, conseguimos agora avaliar com objectividade os feitos e os defeitos que a Primeira República, como qualquer regime, ostentou.
A República nasceu na esperança, mas a sua existência, uma curta vida de quinze anos e alguns meses, foi conturbada.
Os tribunos republicanos souberam difundir o seu sonho, do mesmo modo que o grande pedagogo João de Deus quis que os Portugueses aprendessem a ler: através de “palavras que se digam, que se ouçam, que se entendam, que se expliquem.”
Palavras de esperança foram proclamadas em diversas ocasiões ao longo da nossa História. Palavras como Liberdade, Democracia, República.
Quem invoca aquelas palavras, quem exerce funções em nome delas, é superiormente responsável perante o povo pelo que faz ou deixa de fazer.
Vivemos de novo em democracia. Mais do que dobrámos o tempo de vida do regime iniciado em 1910.
São dias preciosos aqueles em que se consegue fazer renascer a esperança.
Estas Comemorações têm um importante papel a cumprir. Trata-se de inserir os acontecimentos do passado no conjunto da vida de um povo e de os compreender. De falar, ouvir, entender e explicar.
Só assim, obedecendo ao distanciamento que é devido e rejeitando versões oficiais da História, admitindo uma multiplicidade de leituras e de interpretações, poderemos formular juízos e extrair lições.
Uma coisa tenho como certa: a necessidade que sentimos de comemorar a República demonstra que o passado continua em nós, como memória que se quer viva e mobilizadora. Está em nós a capacidade de mudar, de começar de novo todos os dias, podendo ser sempre um pouco melhores, sem pôr tudo em causa. Aprendendo, afinal, com a História.
Na pessoa do seu Presidente, Dr. Artur Santos Silva, felicito a Comissão Organizadora destas Comemorações. Têm sabido interpretar, com dedicação e sentido patriótico, os grandes objectivos que devem nortear a sua realização.
As Comemorações do Centenário poderão ser a semente de um novo espírito de cidadania. As centenas de iniciativas que irão ser lançadas em todo o País, e que se prolongarão para além de 2010, representam a oportunidade ideal para revisitar os valores que unem aqueles que identificam republicanismo com dedicação à Coisa Pública: o amor à Pátria, a ética na vida pública.
Faço votos para que estas comemorações constituam um factor de mobilização nacional, capaz de incutir nos Portugueses do século XXI o mesmo espírito que moveu os revoltosos do 31 de Janeiro: um espírito feito de inconformismo e de esperança, alicerçado no desejo de um Portugal melhor, mais fraterno e mais solidário.
Escolas, autarquias, instituições privadas serão chamadas a tomar parte em múltiplas actividades. Esta é uma festa dos cidadãos. De todos, sem excepção.
A virtude da política democrática reside sobremaneira na sua aptidão para, partindo da divergência, mobilizar e criar unidade. Unidade entre passado e futuro, unidade no presente. Só assim poderemos promover a convergência entre os valores de sempre e as exigências de adaptação a novos tempos.
Bem o entendeu um dos primeiros republicanos, Guerra Junqueiro, quando definiu como projecto “não uma república doutrinária, mas uma larga, franca, nacional, onde caibam todos.”
Um belo ideal que, estou seguro, estas Comemorações ajudarão a cumprir, num momento em que, como em poucas ocasiões na nossa História, tanto precisamos de estar unidos.
Em nome desta esperança colectiva que se chama Portugal, declaro oficialmente abertas as Comemorações do Centenário da República.
© Presidência da República Portuguesa - ARQUIVO - Aníbal Cavaco Silva - 2006-2016
Acedeu ao arquivo da Página Oficial da Presidência da República entre 9 de março de 2006 e 9 de março de 2016.
Os conteúdos aqui disponíveis foram colocados na página durante aquele período de 10 anos, correspondente aos dois mandatos do Presidente da República Aníbal Cavaco Silva.