Encerro aqui a 4ª Jornada do Roteiro das Comunidades Locais Inovadoras, que cobriu cinco concelhos da Área Metropolitana de Lisboa – Cascais, Oeiras, Sintra, Mafra e Amadora –, uma das regiões com maior poder de compra do País, de acordo com os indicadores disponíveis.
Mas isto não nos pode fazer esquecer que existem, na região, estratos sociais com graves carências económicas e situações de provação material: umas, de carácter permanente, outras, fruto do agravamento da situação económica e social.
A crise económica e financeira que atingiu o País trouxe consigo um agravamento da situação social.
Verifica-se um aumento significativo dos números do desemprego: 592 mil desempregados no primeiro trimestre, ou seja, 10,6 por cento da população activa, mais 100 mil do que há um ano atrás; 305 mil estão desempregados há mais de um ano; 100 mil jovens estão desempregados, ou seja, 22,7 por cento. Muitos procuram emprego noutros países por não encontrarem oportunidades em Portugal.
Assiste-se a um aumento das situações de pobreza e exclusão social, com a emergência de novos pobres, pessoas que sofrem em silêncio, que até não há muito tempo viviam com um certo desafogo económico e não imaginavam poder vir a encontrar-se em situação de privação material. A crise fez emergir novos riscos de pobreza, resultado do lançamento de milhares de portugueses no desemprego, do endividamento excessivo das famílias e do enfraquecimento dos laços familiares.
Existe um aumento significativo das pessoas em situação de carência alimentar, precisando de ajuda para combater a fome e para comprar remédios.
É elevado o número de crianças que, nos seus estudos, na sua alimentação, na sua vida do dia-a-dia, sofrem as dificuldades dos familiares vítimas da crise. Temos de fazer todos os possíveis para que as expectativas dessas crianças e o seu bem-estar não sejam afectados pela crise.
Também os idosos e deficientes são atingidos nas suas condições de bem-estar, em resultado das dificuldades por que passam os seus familiares.
Tudo isto num quadro de persistentes desigualdades sociais e do enfraquecimento e degradação dos laços familiares que se tem vindo a verificar.
Temos um Portugal a duas velocidades, como afirmei no meu primeiro discurso na Assembleia da República depois da tomada de posse.
As instituições sociais têm desempenhado um papel decisivo no amortecimento das consequências sociais da crise. São as Misericórdias, as IPSS, os centros paroquiais e outras organizações da igreja, os grupos de voluntariado, as redes de entreajuda e outras associações da sociedade civil de natureza social. Elas são a expressão da força solidária dos Portugueses, que tenho procurado mobilizar desde o início do meu mandato.
O que seria a situação social de centenas de milhares de portugueses, não fora o trabalho das instituições de solidariedade e dos milhares de voluntários?
Instituições que ocupam uma posição de primeira linha no apoio aos grupos mais carenciados, aos idosos, aos deficientes, aos pobres, às pessoas em situação de exclusão, aos atingidos por carências alimentares. E que desempenham, também, um papel significativo no apoio à primeira infância, na integração social, na qualificação e valorização profissional dos jovens, na promoção do empreendedorismo social dirigido a estratos mais vulneráveis, às situações de desemprego e de exclusão social.
Neste tempo de crise, há que estabelecer prioridades, quer a nível central quer local.
É preciso proteger as pessoas de rendimentos mais baixos, garantir os apoios sociais indispensáveis àqueles que são pobres, vulneráveis, às famílias que passam por privações materiais. A resposta às situações de emergência social não pode deixar de ser uma prioridade. As pessoas estão primeiro.
A inclusão social foi a primeira causa que abracei como Presidente da República, logo no meu primeiro discurso do 25 de Abril, na Assembleia da República, em que propus um compromisso cívico para a inclusão social.
Através do Roteiro para a Inclusão, lancei um movimento visando despertar a consciência e a responsabilidade social dos Portugueses para o combate à pobreza, à exclusão social, às desigualdades na distribuição do rendimento.
Os temas tratados ganharam visibilidade na opinião pública e mais destaque na agenda política. Temas como a ameaça de desertificação e envelhecimento em vastas regiões do País, as pessoas com deficiência e os maus-tratos das crianças, a violência doméstica, a redução da natalidade, as desigualdades na distribuição do rendimento, o desemprego e os novos riscos de pobreza, a importância do voluntariado e das instituições de solidariedade.
Tenho procurado actuar de forma a que os portugueses apanhados pela crise não se sintam esquecidos. A pobreza e a exclusão social não são realidades sem remédio.
Durante este Roteiro, encontrei bons exemplos de instituições dedicadas ao apoio dos estratos sociais mais carenciados e vulneráveis: o Centro Comunitário Senhora da Boa Nova, no Estoril; a Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação, em Mafra; a Unidade Residencial Madre Maria Clara, em Oeiras.
A crise levou os Municípios a reforçar a sua acção na área do desenvolvimento social e da promoção da coesão social, como pude testemunhar em Cascais, Oeiras, Sintra, Mafra e Amadora. Hoje, os Municípios desempenham um papel da maior importância no apoio às pessoas em situação de carência alimentar, incluindo os alunos das escolas, no apoio às pessoas com dificuldades na compra de medicamentos, no empreendedorismo social, no apoio às associações que promovem a inclusão e integração social, na articulação das instituições de solidariedade do Concelho e no desenvolvimento de redes de entreajuda.
É uma função que as autarquias, tirando partido da proximidade, desenvolvem com eficiência. O seu contributo tem sido decisivo para atenuar as consequências sociais da crise.
Tive oportunidade de me reunir com 30 directores de escolas e agrupamentos do Concelho de Sintra e conhecer o trabalho que fazem, em estreita colaboração com a Câmara Municipal, para atenuar os efeitos da crise económica sobre a situação dos alunos, de modo a que a tarefa de ensinar e promover o sucesso escolar não seja excessivamente dificultada.
As autarquias e algumas instituições sociais têm dado também o seu contributo em várias áreas do combate ao desemprego.
O desemprego é uma das questões mais dramáticas que o País enfrenta. Não pode deixar de estar no centro das atenções de todos os agentes políticos. É por isso que a recuperação económica sustentável é o grande desafio que temos de vencer e para o qual tenho vindo a mobilizar os Portugueses. Também aqui cabe ao poder local e às comunidades locais inovadoras um papel de relevo.
Os Municípios são, cada vez mais, agentes de desenvolvimento económico, social, cultural e ambiental. A maior parte dos Municípios atribui hoje uma elevada prioridade ao fortalecimento da capacidade produtiva dos respectivos Concelhos, e a sua actuação insere-se bem no caminho que Portugal terá de seguir para ultrapassar a difícil situação com que está confrontado.
Dado o elevado endividamento e as restrições externas que o País enfrenta, a recuperação económica exige o aumento da produção de bens e serviços que concorrem com a produção estrangeira e o aumento da nossa capacidade exportadora. O aumento da competitividade externa das empresas é, assim, a chave do nosso sucesso.
Temos que encontrar novos caminhos de aumento da produtividade, de desenvolvimento de novas áreas de negócio, de penetração em novos mercados. Neste contexto, o reforço da cultura de inovação no domínio económico reveste-se da maior importância. Tal como o estímulo ao empreendedorismo empresarial, considerado hoje uma peça-chave do progresso económico.
Tenho-me empenhado no apoio ao empreendedorismo jovem, o qual constitui uma semente da maior valia para o rejuvenescimento do tecido empresarial português. São jovens empreendedores com elevado nível de formação, familiarizados com as modernas tecnologias, ambiciosos e com talento, abertos ao mercado global, conhecedores de outras gentes e outras culturas. Ao fazer isso, estou a abrir uma janela de esperança para muitos jovens. A qualidade e excelência no ensino, o combate ao abandono e insucesso escolar, a formação profissional são também contributos decisivos para a construção de uma economia de futuro.
A competitividade das PME, a atracção do investimento, o aproveitamento dos recursos próprios da região – naturais, humanos, patrimoniais e culturais –, a qualificação dos recursos humanos, o desenvolvimento de competências profissionalizantes, o estímulo ao empreendedorismo empresarial, à inovação e à criatividade, o apoio à difusão das TIC, ao desenvolvimento de parcerias e redes de contacto têm vindo a merecer uma atenção acrescida por parte das autarquias. São contributos da maior relevância, e que importa valorizar, para a recuperação económica sustentável.
Durante este Roteiro, testemunhei bons exemplos de instituições cuja actuação se insere na linha do desenvolvimento económico e social e de criação de emprego que acabei de referir: a Associação Escola 31 de Janeiro, na Parede; a Agência DNA Cascais; a investigação na área tecnológica da Academia da Força Aérea, na Base de Sintra; a valorização do complexo monumental de Mafra; o Projecto 12-15 e o Programa Empreende, na Amadora; a Escola Intercultural das Profissões e do Desporto, na Venda Nova. Assim como os projectos de inclusão social pela música (Orquestra Geração) e pelo desporto, que vimos no complexo desportivo Carlos Queiroz.
Tenho por objectivos, com o Roteiro das Comunidades Locais Inovadoras, incentivar os vários agentes locais – políticos, económicos, sociais e outros – a agirem como actores de mudança, procurando soluções inovadoras para os problemas locais, dar visibilidade aos bons exemplos e boas práticas locais, e contribuir para a sua difusão, assim reforçando a motivação de outros para agir e contribuir para a melhoria das condições de vida das populações.
Ao longo das nove jornadas do Roteiro para a Inclusão e do Roteiro das Comunidades Locais Inovadoras, visitei 52 concelhos. Encontrei a maior receptividade para o desafio que, em 25 de Abril de 2006, decidi colocar aos Portugueses: o de um compromisso cívico para a inclusão social.
Julgo que os Portugueses entenderam esse meu desafio.
Os cidadãos, mobilizados em torno das suas autarquias, de organizações não governamentais, instituições de solidariedade social, grupos de voluntariado, paróquias e empresas, têm dado provas da sua disponibilidade e empenho para assumirem novas responsabilidades sociais.
Felizmente, pude comprovar, nestes Roteiros, que muito se tem feito e, em muitos casos, bem feito. Os exemplos de instituições e comunidades locais que pude visitar ao longo destes quatro anos permitem-me concluir que é possível, que não há razão para perdermos a esperança.
O Roteiro das Comunidades Locais Inovadoras comprovou que, por todo o País, há autarcas que encontram soluções inovadoras para os problemas das suas comunidades, há voluntários que se dedicam aos outros, instituições sociais que teimam em lutar contra a adversidade.
Há empresas que assumem a sua responsabilidade de criadores de riqueza, que inovam nos seus produtos e nos seus processos de fabrico, que se lançam na área internacional para descobrir novos mercados e novas oportunidades de negócio, que lutam por manter e valorizar o seu capital humano e os postos de trabalho.
Nesta Jornada pelos concelhos de Cascais, Oeiras, Sintra, Mafra e Amadora, encontrei razões acrescidas para acreditar na capacidade dos Portugueses para vencerem os desafios que o País enfrenta.
Senhoras e Senhores
Decidi aproveitar esta ocasião para distinguir algumas pessoas que, nas suas áreas de actividade, deram um contributo significativo para a melhoria das condições de vida das comunidades desta região. É o que irei fazer a seguir.
Agradeço a vossa presença e peço o vosso empenho na multiplicação dos agentes de inovação e de criação de emprego, e no apoio às instituições de solidariedade que dedicam o melhor do seu esforço àqueles que sofrem os efeitos da crise económica que atinge o País.
Muito obrigado.
© Presidência da República Portuguesa - ARQUIVO - Aníbal Cavaco Silva - 2006-2016
Acedeu ao arquivo da Página Oficial da Presidência da República entre 9 de março de 2006 e 9 de março de 2016.
Os conteúdos aqui disponíveis foram colocados na página durante aquele período de 10 anos, correspondente aos dois mandatos do Presidente da República Aníbal Cavaco Silva.