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Cerimónia de agraciamento do Eng. António Guterres
Cerimónia de agraciamento do Eng. António Guterres
Palácio de Belém, 2 de fevereiro de 2016 ler mais: Cerimónia de agraciamento do Eng. António Guterres

INTERVENÇÕES

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Discurso do Presidente da República na Cerimónia de Inauguração da Biblioteca José Cardoso Pires
Vila de Rei, 26 de Outubro de 2008

Senhora Presidente da Câmara Municipal de Vila de Rei,
Senhora Secretária de Estado da Cultura,
Prezados Familiares de José Cardoso Pires,
Minhas Senhoras e meus Senhores,

Em Outubro de 1925, este concelho viu nascer José Cardoso Pires.

Em Outubro de 1998, Portugal viu, com pesar, partir o grande escritor.

Dez anos depois, encontramo-nos em Vila de Rei para lhe prestar a homenagem que todas as terras devem aos seus filhos.

Desde que Cardoso Pires o deixou, o concelho de Vila de Rei mudou muito e eu tive o privilégio de testemunhar essa mudança.

Os vilarregenses decerto se questionaram durante muitos anos: como é possível estar no centro de Portugal e, ao mesmo tempo, estar longe de tudo?

Nesses tempos, Vila de Rei, apesar da sua posição central, não era ponto de passagem para lado nenhum.

Aqui poucos vinham. Que estranho e injusto isolamento esse, por ser um isolamento que atingia aqueles que se encontravam precisamente no meio do todo nacional.

A ninguém escapava a realidade: pouco podia ser feito sem primeiro quebrar o isolamento.

Anos passados, o concelho de Vila de Rei está mais bem servido de vias de comunicação. Recordo o marco que foi a inauguração da nova ponte sobre o rio Zêzere, em Março de 1995, a que, como Primeiro-Ministro, me associei. O isolamento está definitivamente quebrado.

Por isso, hoje muito é possível. Mas o muito que é possível continua a ser difícil, como os vilarregenses e, em particular, a sua infatigável Presidente sabem.

O interior do País está, como sempre, mais longe dos investimentos e do emprego. O interior está despovoado, como nunca esteve.

Vila de Rei sabe o que significa a desertificação dos espaços rurais e o agravamento dos desequilíbrios regionais.

É minha convicção que o País, no seu todo, tem de assumir a responsabilidade de apostar num desenvolvimento mais humano e mais harmonioso. A coesão territorial e a defesa da nossa identidade exigem uma atenção acrescida dos poderes públicos ao grave problema do despovoamento do interior.

Mas Vila de Rei sabe que não pode esperar. E sabe o que tem a fazer.

A sabedoria popular diz que no meio está a virtude. Importa que a virtude se torne mais atractiva. Tem de se dar a conhecer todas as virtudes de Vila de Rei. Para que os bons ares, as águas puras e as pessoas acolhedoras sejam mais bem conhecidos e chamem até cá muitos portugueses que ainda desconhecem a beleza destas terras.

A cultura local também atrai os forasteiros. Mas a cultura é, sobretudo, um meio de desenvolvimento das potencialidades que todo o ser humano tem. Por isso, o acesso à cultura é um dos mais importantes direitos do homem.

Falar de cultura em Vila de Rei remete para as tradições mais antigas e mais vivas junto do povo desta terra.

Mas falar de cultura aqui, sobretudo agora, é também falar de José Cardoso Pires, um dos grandes romancistas portugueses do século XX, cuja obra se projectou igualmente no teatro e no cinema, e está traduzida em várias línguas.

Narrador do social e do humano, rigoroso no uso da palavra e da imagem, corajoso e autêntico nas ideias que transmitia, José Cardoso Pires levou a cabo, com a sua obra, uma sistemática e profunda reflexão sobre Portugal e sobre os portugueses.

Cada livro, disse ele, “é uma busca da minha identificação com o País e comigo próprio”.

José Cardoso Pires teve uma relação difícil com o País e com as suas origens, talvez porque levou essa relação a sério. Como deve ser. Aí, no terreno único da identidade e da autenticidade, é-se tanto mais crítico quanto mais se ama o que se critica.

Nós, portugueses, sabemos como somos.

José Cardoso Pires debateu-se, ao longo da sua vida, com a falta de liberdade e com a busca de um sentido para a liberdade reencontrada.

No final da vida, enfrentou mesmo o supremo dilema de um comunicador: a impossibilidade de comunicar.

Temporariamente recuperado, emocionou os portugueses com a estória de um José diferente de si. De um Cardoso Pires que, pela primeira vez, não encontrava palavras para transmitir o que pensava.

Essa capacidade nunca lhe faltara. Até escreveu, em tempos, sobre as homenagens póstumas. Homenagens que temia poderem constituir apropriação abusiva de uma existência, como foi a sua, que sempre se recusou a vénias e a submissões.

Não é o caso desta homenagem. O José Cardoso Pires que hoje recordamos foi um grande escritor e um português inteiro, na sua insubmissão, nas suas contradições, na aguda inteligência com que pretendia destruir mitos, na sensibilidade capaz de, como dizia, “ir até ao osso”. Foi a sua forma de amar profundamente Portugal e os portugueses.

Na Biblioteca Municipal de Vila de Rei revela-se a aposta da autarquia na cultura como fonte primordial de desenvolvimento. Aqui se acolherá, doravante, boa parte do espólio literário legado pela família de José Cardoso Pires. Aqui luzirá, para sempre, o espírito de um grande escritor português.

© Presidência da República Portuguesa - ARQUIVO - Aníbal Cavaco Silva - 2006-2016

Acedeu ao arquivo da Página Oficial da Presidência da República entre 9 de março de 2006 e 9 de março de 2016.

Os conteúdos aqui disponíveis foram colocados na página durante aquele período de 10 anos, correspondente aos dois mandatos do Presidente da República Aníbal Cavaco Silva.