Pela primeira vez, o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas celebra-se em Setúbal. Vale a pena atentar no esquecimento – se esquecimento foi. Capital de distrito mais próxima de Lisboa, foi, tantas vezes, a que está mais longe das preferências e critérios dominantes. Leiam-se os nossos clássicos ou os nossos modernos. Se nunca ninguém regateou elogios às maravilhas do décor que a envolve (a Arrábida, Palmela, o Outão, Tróia) a cidade, quase tão devastada como Lisboa pelo terramoto de 1755, permaneceu singularmente desconhecida, ressalvando-se apenas desse olvido o Convento de Jesus, com a série de magníficos quadros quinhentistas incomparável a qualquer outro tesouro pictórico das cidades portuguesas, com a eventual excepção de Évora, embora em Évora predomine a pintura flamenga e não, como em Setúbal, a portuguesa quinhentista.
A História pareceu igualmente esquecer Setúbal, pelo menos até meados do século XIII, quando se sagrou e abriu ao culto a igreja de Santa Maria da Graça.
Setúbal, parafraseando o poeta, foi sobretudo o sal e o sol essa "marinha única de harmonia" de que falou Fialho e essa indústria (as marinhas do Sado) que até ao século XVIII fez a prosperidade da cidade, antes dela se tornar, nas primeiras décadas do século XX, no mais importante porto de pesca de Portugal e no seu centro mais importante de conserva de peixe.
Essa é a imagem que perdura da cidade, mesmo que a indústria-conservareira tenha perdido o esplendor de outrora.
Depois, é Setúbal dos poetas com Bocage como figura cimeira; da maior cantora lírica portuguesa de todos os tempos que foi Luísa Todi; de João Vaz, esse pintor que não se esqueceu de pintar a sua terra; de Sebastião da Gama, o poeta da Serra-Mãe, entre tantos outros.
Cidade plena de memórias históricas, cidade eleita do Príncipe Perfeito que nela se casou, foi, na segunda metade do século XX, cidade atormentada por muitos males mas que a todos foi vencendo. Senhora das Águas e Senhora do Sado, merecendo, tanto como em 1525, o título de notável-vila com que D. Manuel I a distinguiu.
João Bénard da Costa
Presidente da Comissão Organizadora das Comemorações
do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas