Senhor Presidente da Câmara Municipal,
Senhor Presidente da Assembleia Municipal,
Senhoras e Senhores,
Comemoramos, em 2008, os 750 anos do Foral de Viana do Castelo, outorgado por D. Afonso III. Comemoramos os 160 anos da sua elevação a cidade, por decreto de D. Maria II. E ainda comemoramos os 130 anos da chegada do caminho-de-ferro a Viana do Castelo.
Neste ano histórico para Viana do Castelo, julguei por bem que as celebrações do Dia de Portugal e das Comunidades tivessem lugar nesta bela cidade que desde a primeira hora é Portugal.
Agradeço a todos os vianenses e, em particular, à Câmara Municipal, na pessoa do seu presidente, toda a colaboração prestada e todo o entusiasmo que colocaram nestas comemorações.
Encontramo-nos nas margens do Lima, o curso de água que os soldados romanos encontraram no fim da sua demanda de conquista e confundiram com o lendário Rio do Esquecimento. Quem se atrevesse a passar para a outra margem, acreditavam, perderia a memória do seu passado, da sua família e da sua pátria. Nada pior lhes poderia acontecer.
O seu general, Décio Júnio Bruto, teve de cruzar ele próprio o rio, vencendo o temor que decerto sentia, para demonstrar que esta não é terra de esquecimento, mas terra de memória viva.
“Porque é instável a memória dos homens, encontrou-se o remédio da escrita para que os actos dos mortais se tornassem firmes e chegassem ao conhecimento dos vindouros.”
Esta passagem notável do Foral de Viana do Castelo vinca, nas palavras de D. Afonso III, a importância da preservação da memória colectiva.
No Minho da terra eternamente vestida de verde, entre a serra e o mar, núcleo da Terra Portugalense, guarda-se a memória da cultura castreja e de uma longa tradição de resistência que sempre serviu a nossa causa nos momentos difíceis.
Nesta cidade virada ao sul, debruçada para o mundo que descobrimos, guarda-se também a memória de um Portugal que recusou confinar-se a um canto da península europeia e aceitou o desafio da distância e do desconhecido.
Relembro a figura de Diogo Álvares, o vianense que, como tantos outros, daqui partiu, enfrentando, nas palavras de Camões
“(…) as várias partes que os insanos
Mares dividem, onde se apousentam
Várias nações, que mandam vários Reis,
Vários costumes seus e várias leis.”
Vejo Diogo Álvares, que no Brasil foi mediador entre homens e culturas, como um exemplo do português do mundo, aquele português que aproximou globalmente os povos.
No Minho das devoções e invocações, das romagens e romarias, das confrarias e irmandades, guarda-se ainda a memória de Frei Bartolomeu dos Mártires, humilde mas firme arauto da verdade perante os grandes, pertinaz defensor dos interesses pátrios.
Em cumprimento de um dever nacional de reconhecimento para com este grande português, que escolheu Viana do Castelo para viver os últimos dias e que os vianenses quiseram que repousasse para sempre nestas terras, prestei hoje mesmo pública homenagem à figura singular de Frei Bartolomeu dos Mártires.
O mundo em que vivemos premeia aqueles que aceitam um destino universal sem perderem as amarras da memória. Em Viana, guardiã da memória, vencedora do Rio do Esquecimento, encontramos fios que nos ligam no tempo, fios indestrutíveis como os cordões de ouro que a mãe minhota lega a sua filha numa cadeia que é um elo vivo entre gerações.
Aqui defende-se a memória de Portugal com o mesmo vigor com que se preservam as recordações mais íntimas nessas jóias tão próprias da ourivesaria vianense: as memórias, peças que guardam carinhosamente no seu cofre uma recordação ou uma saudade.
Eis, pois, Viana do Castelo, cidade aberta ao mar e ao mundo, acolhendo hospitaleiramente o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades.
“Havemos de ir a Viana,
Ó meu amor de algum dia”
Assim cantou Amália Rodrigues as palavras de Pedro Homem de Mello.
Neste Dia de Portugal, Portugal veio a Viana.
Renovámos a recordação do que somos e o desejo do que podemos ser. Vencemos de novo o Rio do Esquecimento.
Mas a memória,
“(…) é como o vento,
Quem pára perde-lhe o jeito,
E morre a todo o momento.”
Havemos de voltar a Viana, algum dia. Em breve, certamente.
Muito obrigado.