VII Conferência Crianças Desaparecidas e Exploradas Sexualmente promovida pelo Instituto de Apoio à Criança
Assembleia da República, 24 de Maio de 2013

Tem sido longo e doloroso o caminho de alerta para o problema das crianças sexualmente abusadas e exploradas, vítimas de rapto e de violência. Por toda a Europa o esforço das organizações cívicas e dos Governos tem sido real e permitam-me destacar o papel inestimável que, em Portugal, o Instituto de Apoio à Criança tem vindo a desempenhar.

É um esforço que tem dado alguns frutos, mas receio que se revelem insuficientes face ao incontrolável número de casos que todos os dias nos confrontam com uma realidade envolta numa impenetrável e terrível cortina de silêncio e de desconhecimento da verdadeira dimensão do problema, quer em Portugal, quer na Europa e no Mundo.

A Convenção do Conselho da Europa contra a Exploração Sexual e os Abusos Sexuais, conhecida internacionalmente como a Convenção de Lanzarote, foi um marco histórico neste esforço de combate a uma das mais repugnantes formas de violência sobre as crianças. Registo com agrado o facto de a referida Convenção ter entrado em vigor em Portugal no passado dia 1 de Dezembro de 2012.

Mas, infelizmente, os factos não nos deixam repousar sobre a consagração na nossa ordem jurídica do compromisso que essa convenção representa. É necessário identificar a verdadeira dimensão do problema e desta constante ameaça sobre as nossas crianças. Temos de desenvolver mais investigação e melhor conhecimento sobre estas práticas de forma a que, para além da criminalização, se possa desenvolver uma verdadeira política de prevenção que envolva desde o simples cidadão, aos pais, às organizações cívicas, às instituições públicas e aos governos.

Os números, mesmo que as estimativas assumam uma considerável margem de erro, não nos deixam descansar porque são assustadores.

- Estima-se que 27 milhões de adultos e 13 milhões de crianças em todo o Mundo são vítimas de tráfico humano. Deste total quase 80% estão associados ao negócio do sexo. E mais de metade do tráfico e escravidão sexual incide em crianças e jovens com menos de 16 anos.

- Em 2008, 30% dos casos identificados de tráfico envolviam crianças destinadas à indústria de sexo.

- De acordo com a UNICEF, estima-se em cerca de 2 milhões as crianças, na sua maioria raparigas, que são exploradas pela indústria do sexo.

- Em 54% dos casos de tráfico humano o angariador é um estranho, mas nos restantes 46% o recrutamento é feito por pessoas próximas da vítima, senão mesmo familiares.


- Calcula-se que 30.000 seja o número de vítimas do tráfico sexual que anualmente morrem por abuso, doença, tortura ou negligência. Cerca de 8% dos que são traficados para escravatura sexual, têm menos de 24 anos e alguns não têm mais de seis anos.

A indústria do sexo ganhou uma dimensão nunca antes conhecida com o desenvolvimento da INTERNET e com a globalização e massificação do turismo sexual. Hoje as redes de tráfico de crianças estão organizadas à escala global e a comercialização das imagens e dos vídeos digitais representam um dos negócios mais volumosos e mais lucrativos. Em 2009, uma equipa do Centro Nacional das Crianças Desaparecidas e Exploradas (Estados Unidos), identificou mais de 10,5 milhões de imagens pornográficas de crianças disponíveis na internet.

Deixámos que o “monstro” crescesse e possivelmente acordámos tarde para a destruição silenciosa que está a provocar.

Temos de redobrar os esforços porque acções isoladas podem ser muito meritórias mas não são eficazes.

Mas, por muito que nos custe, é preciso reconhecermos que o global, infelizmente, por vezes começa à nossa porta.

Desejo que os trabalhos desta Conferência abram novos caminhos que nos permitam enfrentar com atos concretos este flagelo da nossa civilização.