Discurso da Drª Maria Cavaco Silva na cerimónia de lançamento da primeira pedra da “Casa dos Marcos”, da “Raríssimas”, Associação Nacional de Deficiências Mentais e Raras
Moita, 1 de Julho de 2010

Hoje é um dia bom.

Muitos dos que estão aqui já sonhavam com ele há muito tempo.

Esta é uma história bonita que dá prazer partilhar.

Pela minha parte acho que fui apanhada quase no princípio.

O Marco tinha-se ido embora havia pouco e a Paula estava muito sofrida, mas já cheia de planos.

Saibam todos os que aqui estão hoje que esta é uma história de amor entre uma mãe – Paula – e um filho – Marco, que vai estender-se agora a muitas mais mães e muitos mais filhos.

Foi numa revista que, em Abril de 2006, eu soube pela primeira vez dessa história que me comoveu e me fez sentir que afinal o mundo é um lugar muito melhor do que andam por aí a apregoar.

Quis conhecer a Paula e em boa hora o fiz, porque é sempre enriquecedor conhecer pessoas como a Paula. E nesse momento fiquei logo madrinha de alma do projecto que estava já todo no coração da Paula e começou a criar raízes em mim. Queria dar visibilidade ao sonho da construção da Casa dos Marcos e associar-me a esta ideia que, além de muito bonita, senti logo como muito necessária e pioneira no mundo difícil e complicado das Doenças Raras.

Nesse primeiro encontro a Paula já sabia tão bem o que queria fazer que achei que na cabeça dela a Casa dos Marcos até já estava mobilada. Tal é a força de acreditar!

O que me chamou mais a atenção naquele caso de amor sem barreiras foi a infinita, total confiança, que o Marco tinha na mãe.

- Mãe se já não há escola para mim, faz tu uma!

Hoje, aqui, sabemos que o Marco tinha toda a razão.

Quando ele partiu, a Paula, que tinha um filho raro, decidiu dedicar a sua vida a muitos filhos raríssimos. E se o Marco acreditava totalmente na Mãe hoje, felizmente, já somos muitos a acreditar.

Hoje estamos a lançar a primeira pedra de um sonho que ela começou por sonhar sozinha, mas que teve a habilidade, a coragem e a capacidade de transformar num sonho colectivo que nos envolve a todos nós que aqui estamos e a todos os que aqui não estão.

Ela soube arrastar consigo, para lá de muitas almas de boa vontade, pessoas de alto nível científico e técnico, que sabiam muito bem onde se estavam a meter.

Assim tivemos a alegria de em 2008 apresentar publicamente o Conselho Científico da Raríssimas, de que fazem parte vinte e dois conceituados cientistas de várias áreas.

Tivemos a alegria de lançar este ano, no Dia Europeu das Doenças Raras, a 9 de Fevereiro, um livro importantíssimo para todas as pessoas que na sua vida são confrontadas com a necessidade de atender directamente um dos seus familiares ou amigos, com uma destas patologias: Doenças Raras de A a Z.

Nesse mesmo dia, foi apresentado o Estudo Observacional com vista à Elaboração do Registo de Doentes com Patologias Raras. Todos os envolvidos neste projecto sabem como isto são passos chave para os que sofrem de doenças raras e raríssimas.

Este sonho abrange a sociedade que já somos, mas vai em direcção a uma sociedade que todos queremos ser e temos obrigação de ser: mais justa, mais capaz de responder aos problemas graves dos seus membros mais frágeis.

A Casa dos Marcos vai responder a uma das maiores aflições dos que lidam com os nossos cidadãos diferentes.

A preocupação maior que tenho encontrado em todas as famílias que têm a seu cargo pessoas com patologias mais ou menos incapacitantes é precisamente este grito de alma: como vou eu descansar um pouco? Quem vai tratar do meu ente querido quando eu desaparecer?

Como podemos tratá-los adequadamente, fazê-los felizes, cumprir a nossa responsabilidade afectiva e social para com eles?

O trabalho está longe de acabado, mas este momento é uma indicação tão forte de que vamos conseguir que temos o direito de celebrar.

Celebremos, pois, e acreditemos que estamos no bom caminho para dentro de pouco tempo nos juntarmos todos outra vez na inauguração da Casa dos Marcos.