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PRESIDENTE da REPÚBLICA

INTERVENÇÕES

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Discurso do Presidente da República no 2º Congresso dos Economistas
Centro de Congressos de Lisboa, 11 de Outubro de 2007

Senhor Bastonário da Ordem dos Economistas
Senhor Presidente da Comissão Organizadora do Congresso
Caros Economistas
Senhoras e Senhores

Começo por saudar, na pessoa do seu Bastonário, a Ordem dos Economistas, que muito tem pugnado pela promoção e pela dignificação da profissão. Esta iniciativa é, de resto, um expressivo testemunho de vitalidade da Ordem. Saúdo também o Presidente da Comissão Organizadora deste II Congresso dos Economistas e todos os participantes que irão debater, durante dois dias, temas tão complexos quanto oportunos.

Aos Professores Manuel Jacinto Nunes, Bento Murteira e Simões Lopes, bem como aos Professores Ernâni Lopes e Eduardo Catroga, hoje aqui homenageados pela Ordem dos Economistas, dirijo uma palavra de muito apreço e amizade. É mais do que justo reconhecer publicamente os relevantes contributos que têm dado nos domínios da economia, da estatística e da gestão e, mais do que isso, a sua qualidade de professores de craveira excepcional que formaram gerações de economistas e gestores no nosso País.

É-me particularmente grato dirigir-me a todos vós na sessão de abertura deste Congresso. Faço-o na qualidade de Presidente da República. Não esqueço, contudo, a formação de economista que é a minha e que, naturalmente, marcou o meu pensamento e muito me ajudou a lidar com os desafios que tenho enfrentado nas minhas responsabilidades públicas.

Nas sociedades modernas, o papel do economista é crucial. O domínio das ciências económicas é fundamental para os poderes públicos administrarem os recursos do Estado com sentido estratégico, eficiência e equidade. É igualmente instrumental na gestão das empresas, em particular face ao confronto competitivo que se lhes depara na era global que é a nossa.

Os economistas, seja pela abrangência da sua formação específica, seja pela capacidade que adquirem para integrar diferentes conhecimentos e áreas do saber, são actores decisivos na modernização da economia e da sociedade.

Deles se espera que contribuam para a racionalização dos meios e para a inovação de produtos e de métodos. Deles se espera, também, que promovam uma renovada responsabilidade social dos agentes económicos, sejam eles públicos ou privados.

Destaco, em particular, o papel que lhes cabe como agentes promotores das mudanças necessárias para garantir o progresso económico e social.

Quem, melhor do que os economistas, entende a importância da inovação como factor de competitividade das empresas e como instrumento para melhorar a eficiência e a qualidade das políticas públicas? E é deles, igualmente, que se esperam soluções políticas que permitam contemplar, nesse processo de necessária e inevitável mudança, preocupações de equidade e de coesão social.

Por outro lado, a sua actividade profissional, em particular daqueles que se dedicam à gestão, proporciona-lhes uma percepção privilegiada da responsabilidade social das empresas. Esta é uma dimensão nova da actividade empresarial, que é tanto mais importante quanto mais avançamos na globalização dos mercados. A sustentabilidade competitiva de qualquer empresa tem de integrar a responsabilidade social como um dos activos de afirmação e de sucesso.

Urgente é também desenvolver a iniciativa empreendedora, sobretudo nos jovens. Aqui também pode ser muito relevante a acção dos economistas. Do pensamento, da iniciativa e da experiência de muitos economistas têm surgido conceitos, modelos, instrumentos com impacto estruturante não só na economia, mas na própria sociedade.

Dou apenas um exemplo, que me parece particularmente estimulante e oportuno evocar nesta ocasião e perante esta audiência. Refiro-me a Muhammad Yunus, o Professor de Economia que criou um novo conceito de crédito, hoje mundialmente conhecido por “microcrédito”. Não se limitou apenas a criar o conceito. Empreendeu ele próprio a sua realização. O impacto económico e social foi de tal monta que Muhammad Yunus se tornou uma referência. Conquistou o Prémio Nobel, não o Prémio Nobel da Economia como se poderia pensar, mas o Prémio Nobel da Paz.

Racionalização, inovação, responsabilidade social e empreendedorismo são, pois, termos primaciais no exercício da profissão de economista. Sublinho: da qualidade da prestação dos economistas portugueses dependerá, em boa parte, a competitividade das empresas portuguesas e o desempenho eficaz das políticas públicas nacionais.

Senhoras e Senhores Congressistas

A economia portuguesa encontra-se numa fase decisiva. A irreversível globalização, a imparável vaga de transformações tecnológicas e o aprofundamento da integração europeia colocam a economia do nosso país perante desafios inadiáveis.

Sabemos, contudo, que estes são também fenómenos geradores de extraordinárias oportunidades, que podem constituir uma alavanca ímpar de desenvolvimento. Se soubermos tirar partido das oportunidades decorrentes da inovação tecnológica, da integração europeia e da globalização, colheremos o devido retorno, isto é: a melhoria do bem-estar e da qualidade de vida dos nossos cidadãos.

Por isso, a atitude perante estes desafios deve ser de responsabilidade, mas também de confiança. Estes não são desafios sem precedentes para Portugal, e a nossa História e os nossos recursos justificam que encaremos o futuro com firme vontade de vencer.

Inaceitável é qualquer atitude de resignação perante o desempenho da economia portuguesa nestes primeiros anos do século XXI. Para além de taxas de crescimento inferiores às dos parceiros europeus, Portugal tem acumulado vários desequilíbrios, incluindo os de natureza macroeconómica. Desequilíbrios que não são sustentáveis e cuja resolução é essencial, sob pena de constituírem não apenas um problema de curto prazo, mas, acima de tudo, um pesado obstáculo ao desenvolvimento futuro.

Por isso, não podemos conformar-nos com uma retoma mínima, ao sabor de flutuações conjunturais. Precisamos, isso sim, de um regresso à convergência real com o grupo de países mais desenvolvidos da União Europeia.

Todos – cidadãos, agentes políticos e económicos, instituições públicas, sociedade civil em geral – temos de ter esta ambição. Se formos fracos na ambição, será mais difícil mobilizar as nossas energias e alcançarmos bons resultados.

O relançamento da economia portuguesa depende, em larga medida, do desenvolvimento de uma capacidade exportadora, continuada e sustentada, que não esteja dependente de ciclos económicos ou de oportunidades pontuais.

O elevado défice externo que a economia portuguesa apresenta é motivo de preocupação, já que absorve recursos essenciais para o crescimento económico e pode tornar-se fonte de sérios constrangimentos ao funcionamento normal da economia.

Para além do indispensável controlo das finanças públicas, é preciso cuidar de outras condições essenciais para garantir elevados níveis competitivos à economia portuguesa.

A questão da qualidade e eficiência das políticas públicas é de crucial importância.

A confiança das populações, dos agentes económicos e sociais e, em particular, dos investidores depende em muito da qualidade da governação pública. Isto significa não só políticas públicas adequadas às novas exigências e realidades, mas também instituições fortes e credíveis, procedimentos eficazes e transparentes, e um firme combate à corrupção em todos os níveis dos poderes públicos.

Temos também de estar motivados para agir, de forma rápida e consistente, face às mudanças nos paradigmas económicos e sociais decorrentes da integração europeia e da globalização.

O empenho na inovação não deve limitar-se à realidade empresarial: as novas tecnologias devem permitir também um relacionamento mais eficaz entre a administração pública e os cidadãos, e devem, acima de tudo, contribuir para melhorar a própria definição e execução das políticas públicas, nomeadamente na área da saúde, da educação, da segurança social e do ambiente.

Este é um desafio a que o Estado tem de responder. Mas trata-se também de um desafio para os economistas, cuja intervenção não se pode esgotar na procura incessante do progresso económico.

Cabe aos economistas preocuparem-se com fenómenos como as elevadas taxas de desemprego e os efeitos sociais eventualmente adversos que resultam das políticas de crescimento, e conceber esquemas de protecção social que garantam níveis mínimos de consumo e de bem-estar à população mais atingida pelos processos de transformação e de reforma das economias.

É neste contexto que quero chamar a atenção para a importância do QREN, um instrumento que considero verdadeiramente estruturante da economia nacional. Devemos reter bem o que a sigla significa: Quadro de Referência Estratégico Nacional. A designação é bem expressiva e não a devemos perder de vista. O QREN deve ser uma referência com alcance estratégico e com uma projecção verdadeiramente nacional. O período 2007-2013 tem de colocar Portugal na média da União Europeia. Essa tem de ser a nossa ambição.

Os economistas e gestores aqui presentes recordam-se bem do que aprendemos nas disciplinas de desenvolvimento económico: o crescimento assente na mera acumulação de capital não é sustentável. Só o aumento da produtividade assegura maiores níveis de bem-estar: isto significa uma preocupação permanente com a qualidade e o retorno dos investimentos, com a inovação tecnológica e empresarial e com o papel da poupança.

Por isso mesmo, a abordagem que temos de fazer a este QREN não deve ser meramente quantitativa. O critério principal para aferir dos seus méritos tem de ser o seu contributo efectivo para o desenvolvimento sustentável do nosso País, na sua tríplice perspectiva: económica, social e ambiental.

Os apoios comunitários têm de ser criteriosamente administrados e é indispensável que a execução do QREN seja feita com um elevado sentido estratégico, funcionando como um farol-referência para as políticas públicas e até para o investimento, público e privado.

Importa, pois, que o QREN seja um efectivo instrumento mobilizador e aglutinador. Isto é, tem de envolver não só a Administração Central, mas também os governos regionais, as autarquias, as empresas, e a sociedade civil em geral.

O QREN é uma oportunidade ímpar para chamar à reflexão e ao debate sobre o nosso futuro colectivo os diversos agentes do Estado e das áreas económicas, sociais e ambientais. Deve ser entendido como um instrumento que traduz um contrato implícito entre o Estado e a sociedade, visando o desenvolvimento global do País. E tem de ser executado à medida das nossas ambições.

Daqui apelo, pois, aos nossos economistas para que se envolvam no debate sobre a orientação e aplicação dos fundos comunitários.

Sei, todos sabemos, que o QREN coloca também o País sob escrutínio externo, no que toca à qualidade e coerência do rumo estratégico, à eficiência e transparência da gestão e à mobilização do País. Este é um desafio que exige certamente uma liderança política forte, mas também um empenho e uma consciência nacionais que não devem ser subestimadas, muito menos alienadas.

Neste contexto de mobilização nacional, quero destacar, em particular, o papel das PME’s. Uma parte muito importante do nosso tecido produtivo é constituído por Micro, Pequenas e Médias Empresas, que cobrem a totalidade do território nacional, induzem significativo valor económico e geram emprego. A sua sustentabilidade constitui um elemento fundamental ao equilíbrio do desenvolvimento económico e à coesão social do País.

As PME’s merecem, também por isso, uma atenção especial das políticas públicas. A tão necessária reestruturação do nosso tecido empresarial não pode ser feita contra as PME’s, nem pode ser o mero corolário estatístico do seu desaparecimento. É crucial que as nossas pequenas empresas possam ter oportunidade de se modernizar e crescer num ambiente concorrencial justo e equilibrado.

Refira-se, a este propósito, que a Comissão Europeia se prepara para colocar a questão das PME’s no centro da sua agenda reformista. Na comunicação que a Comissão Europeia preparou para o Conselho Europeu de Lisboa refere-se explicitamente a intenção de libertar o potencial de crescimento e de criação de emprego das PME’s e de fazer pleno uso das suas capacidades inovativas. Neste sentido, a Comissão Europeia irá elaborar, até ao final de 2008, um “Small Business Act” para a Europa, com vista a promover um conjunto de medidas destinadas a apoiar o desenvolvimento das PME’s.

Esta é, aliás, uma obrigação tão económica como de coesão social e territorial. As questões do ordenamento do território e, em particular, da coesão territorial, devem constituir uma preocupação dos economistas. A desertificação e o envelhecimento populacional em muitas zonas do interior do País exigem um combate concertado por parte da Administração Central, autarquias, agentes económicos e sociais. Trata-se de um desafio urgente.

Caras e Caros economistas,

O desafio é claro: colocar Portugal na linha da frente da União Europeia. A resposta a este desafio, tão exigente quanto incontornável, não pode ser de cariz conjuntural nem defensivo. Vencer esse desafio é possível com a mobilização da vontade dos portugueses.

Os economistas, pela sua formação de base, pela sua experiência profissional, pela sua cultura de acção têm uma palavra relevante que deve ser atentamente escutada. Palavra dos mais experientes, mas também dos mais jovens, que estão agora a iniciar as suas carreiras profissionais. O País precisa do contributo dos jovens economistas, do seu talento, da sua capacidade de empreender, da sua cultura de risco e de inovação. Constituem um recurso precioso que é preciso estimular e valorizar.

A palavra é agora dos Congressistas. Espero que o vosso trabalho se salde por um marcado sucesso.

Muito obrigado.

© Presidência da República Portuguesa - ARQUIVO - Aníbal Cavaco Silva - 2006-2016

Acedeu ao arquivo da Página Oficial da Presidência da República entre 9 de março de 2006 e 9 de março de 2016.

Os conteúdos aqui disponíveis foram colocados na página durante aquele período de 10 anos, correspondente aos dois mandatos do Presidente da República Aníbal Cavaco Silva.