Quero em primeiro lugar apresentar as minhas felicitações ao escritor Claudio Magris, figura maior da cultura europeia contemporânea, a quem foi atribuído o Prémio Helena Vaz da Silva, na sua primeira edição.
O prémio destina-se a distinguir anualmente um cidadão, que ao longo da sua carreira se tenha evidenciado pela sua atividade de divulgação, defesa e promoção do Património Cultural Europeu.
Essa marca europeia está bem vincada no nome que lhe foi atribuído e com o qual se presta homenagem a uma personalidade portuguesa, cujo perfil intelectual e cívico se confunde quer com a Europa, quer com a própria cultura.
Helena Vaz da Silva morreu há pouco mais de uma década, quando havia ainda muito a esperar da sua inteligência e do seu dinamismo.
Ficaram, no entanto, marcas indeléveis da sua passagem nas várias instituições em que serviu o País e a União Europeia.
Como jornalista e, sobretudo, como deputada ao Parlamento Europeu, Helena Vaz da Silva foi incansável na promoção dos valores de uma Europa cuja identidade reside, antes de mais, na partilha das raízes culturais que ao longo de séculos, na paz e na guerra, ligaram entre si os diversos povos que se fixaram no continente.
Como responsável pela Comissão Nacional da UNESCO, bateu-se com denodo e enorme sucesso pelo reconhecimento e elevação dos bens portugueses a Património Mundial.
Como presidente do Centro Nacional de Cultura, durante mais de 20 anos, foi notável a sua ação em prol da defesa e divulgação da nossa língua e do nosso património.
Atribuir o nome de Helena Vaz da Silva a um prémio com estas características não representa apenas um gesto de gratidão e saudade, que lhe era inteiramente devido. É também uma prova de que o seu empenho na preservação da herança cultural portuguesa e europeia não foi em vão.
Quero, por isso acreditar, conhecendo Helena Vaz da Silva, como alguns de nós e eu próprio tivemos o privilégio de conhecer, que a atribuição de um prémio com o seu nome a alguém como Cláudio Magris seria para ela um motivo de enorme regozijo.
Não haverá, com certeza, um outro autor nos dias de hoje, em cuja obra a ideia de Europa esteja plasmada com tanto rigor e sensibilidade, com tanta erudição e profundidade.
Ainda não há muito tempo, uma conceituada revista internacional chamava a Claudio Magris «o mais europeu dos escritores vivos».
A Europa é de facto um tema e uma preocupação que se repete nos seus ensaios e nos seus artigos, um lastro que está subjacente a todos os seus romances.
Não se trata de uma ideia abstrata, ou de uma Europa fechada como fortaleza, supostamente imutável desde a origem.
A Europa de Claudio Magris é a Europa que tem no seu código genético a diversidade dos povos e das línguas, a Europa que ao longo dos séculos se foi constituindo e aprofundando, no confronto e no diálogo travado entre civilizações e culturas diferentes.
O mais famoso dos seus romances, aquele a que deu o nome do rio Danúbio, pode mesmo considerar-se um hino à convivência pacífica e à tolerância entre os povos.
Mais do que um livro de viagens, Danúbio é um verdadeiro símbolo desse «continente espiritual» que é a cultura europeia.
Percorrendo as duas margens do rio, desde a nascente, na Alemanha, até ao Mar Negro, o escritor recupera todo esse mosaico de gentes, que ora combateram, ora negociaram entre si; conheceram impérios e revoluções; viveram, enfim, as contingências da história, mas encontraram sempre maneira de retomar o diálogo, preservando, cada uma delas, a sua própria identidade.
Num momento como aquele em que vivemos, em que tantos se questionam sobre a justeza e a viabilidade do projeto da União Europeia, a obra de Claudio Magris tem o condão de recuperar os alicerces desse projeto, levando-nos a encará-lo, não apenas como solução para problemas do imediato, mas também como um destino irrecusável, que o passado nos indica.
Renovo, por isso, as minhas felicitações ao autor de uma obra tão original e tão repassada de sensibilidade. Faço votos para que os valores que inspiraram essa obra encontrem eco na construção da Europa que todos desejamos, uma Europa em que se preserve a paz, a tolerância e a prosperidade.
Gostaria ainda de felicitar os portugueses responsáveis pelos projetos que foram galardoados, este ano, com o Prémio Europa Nostra.
Congratulo-me pela distinção que lhe foi atribuída e pelo muito que ela representa, como reconhecimento do interesse e do cuidado que nos deve merecer o extraordinário património que os antepassados nos legaram.
Felicito, finalmente, todas as organizações associadas à atribuição destes Prémios, muito em especial o Centro Nacional de Cultura, que tem sido entre nós, ao longo das últimas décadas, um exemplo do muito que a iniciativa dos cidadãos pode fazer pelo interesse público.
A todos, o nosso bem-hajam.