As minhas primeiras palavras são de parabéns aos artistas premiados e a todos aqueles que viram as suas obras seleccionadas para a 16ª edição da Bienal de Cerveira.
Felicito-os por esta prova de reconhecimento do seu trabalho e do seu talento. Felicito-os, acima de tudo, pela sua participação neste certame, que trouxe a Vila Nova de Cerveira o justo título de Vila das Artes, ao mesmo tempo que a projectou como um local emblemático no roteiro da arte contemporânea.
Não é a primeira vez que estou presente no Acto inaugural de uma Bienal de Cerveira. Em Julho de 1986, como Primeiro-Ministro, visitei a 5ª Bienal, na companhia dos seus directores de então, Jaime Isidoro e José Rodrigues, dois dos mais significativos nomes da cultura no Norte de Portugal. Recordo, dessa visita, a homenagem a Santa-Rita Pintor e o espaço dedicado aos primeiros artistas abstractos portugueses, Arlindo Rocha e Fernando Lanhas. Mas lembro também a presença de artistas contemporâneos, como José Pedro Croft, Jorge Molder, Pedro Cabrita Reis, Pedro Calapez ou Fernanda Fragateiro.
E, passados todos estes anos após a primeira edição da Bienal de Cerveira, verifico com satisfação que algumas das obras de arte que tenho em casa são de artistas intimamente ligados à Bienal de Cerveira, como é o caso de Jaime Isidoro e José Rodrigues, mas também de Augusto Canedo, hoje Director Artístico da Bienal.
Ao vir de novo aqui, à Bienal, não posso deixar de evocar, com enorme saudade e admiração, Jaime Isidoro, que infelizmente nos deixou em Janeiro de 2009. Pelo seu percurso, enquanto pintor e galerista, e pelo projecto que desenvolveu em prol da cultura, designadamente o seu contributo para a criação e desenvolvimento dos Encontros Internacionais de Arte, primeiro, e da Bienal Internacional de Arte de Cerveira, depois, Jaime Isidoro é merecedor da nossa mais profunda estima e consideração. Foi ele o primeiro director artístico da Bienal de Cerveira e um dos principais responsáveis por esta vila ser hoje, mais de 30 anos depois, também conhecida como a Vila das Artes.
Gostaria igualmente de me associar à justa homenagem que esta edição da Bienal decidiu prestar ao Mestre José Rodrigues, outro dos seus primeiros e mais entusiastas promotores.
Na verdade, José Rodrigues não é só o desenhador, o ceramista, o escultor que todos conhecemos e cujas obras podemos admirar em tantos lugares do Mundo. É também o cidadão empenhado, que assumiu um papel activo no lançamento de muitos projectos de associativismo cultural, alguns dos quais perduram até hoje. Por esse motivo, homenagear José Rodrigues é um acto de justiça, principalmente aqui, na Bienal de Cerveira, que além de contar com o seu nome entre os fundadores, tem cumprido o objectivo de promover a cultura e a arte junto das populações.
A Bienal de Cerveira é, certamente, um caso exemplar, não apenas no que respeita à cultura, mas também no que respeita ao ordenamento do território e até mesmo à projecção internacional do País.
Em 1978, ano em que a ideia se concretizou pela primeira vez, alguém que conhecesse a realidade portuguesa, sobretudo a do interior, dificilmente acreditaria, ou poderia sequer imaginar, que três décadas depois iríamos estar aqui, a inaugurar um acontecimento cultural com esta dimensão e este relevo.
Nesse tempo, os equipamentos e as instalações escasseavam, sobretudo fora das grandes cidades. A educação artística era rudimentar. O mercado da arte estava confinado a uma elite muito reduzida. Se a tudo isto juntarmos os graves problemas económicos, que já na altura se faziam sentir, não é difícil imaginar quanto a ideia deveria parecer descabida, aos olhos de muita gente.
Como se explica, então, o lançamento, e a posterior consolidação, de uma iniciativa como a Bienal, numa vila do Alto Minho? O segredo deste caso de sucesso, invulgar em qualquer parte do Mundo, creio que se pode resumir em duas palavras: imaginação e persistência.
Imaginação de artistas, sem dúvida; mas imaginação, também, dos autarcas, que lhes lançaram o desafio e souberam esperar para colher, no longo prazo, os resultados.
Persistência de pintores, escultores e galeristas, que agarraram a oportunidade e não desistiram às primeiras críticas; mas persistência, também, do Município de Cerveira, que teve a tenacidade bastante para fazer da Bienal uma rotina, assumindo-se orgulhosamente como um pólo artístico e cultural.
Já havia, é verdade, muito antes da Bienal, boas razões para visitar Vila Nova de Cerveira, desde o castelo à paisagem, passando pelas igrejas e solares de frontaria apalaçada.
O património natural e histórico, um pouco à semelhança do que acontece em outros lugares do nosso País, reveste-se aqui de uma exuberância e riqueza que impressionam o visitante.
Não basta, porém, termos herdado um património do qual podemos legitimamente orgulhar-nos. É preciso também saber geri-lo, dinamizá-lo, de forma a que as populações possam usufruir dele, quer do ponto de vista cultural e estético, quer do ponto de vista do desenvolvimento e da qualidade de vida. E, desse ponto de vista, a Bienal veio acrescentar uma dimensão completamente nova às potencialidades já existentes em Vila Nova de Cerveira.
A princípio, foi apenas um acontecimento efémero, aparentemente insólito, que surgia só de longe em longe. Com o correr do tempo, a música e outras artes associaram-se à pintura; o número de artistas e de visitantes foi aumentando; surgiram galerias e, muito em breve, será inaugurado um museu com obras apresentadas na Bienal. Damo-nos, pois, conta de que Vila Nova de Cerveira, além do local aprazível que sempre foi, é também um pólo internacional de arte contemporânea e um destino turístico para quem quiser conhecer os movimentos e tendências da arte nas últimas três décadas.
A importância que a Bienal adquiriu é bem visível no facto de ela se desenvolver, este ano, simultaneamente, aqui em Cerveira, no Porto e em Vigo. Mas o seu alcance vai muito para lá dessa dimensão local e regional. Ao projectar-se como iniciativa sem fronteiras, onde concorrem artistas de todo o Mundo, é também a imagem de Portugal que Cerveira projecta: a imagem de um País com um profundo enraizamento histórico e uma forte identidade, mas um País, também, onde a contemporaneidade tem lugar cativo.
Em 1978, a primeira Bienal celebrava o acto de criar em liberdade. Em 2011, visitar Cerveira é visitar também um palco da criação livre, um lugar de expressões artísticas que nos permitem uma intensa viagem aos mundos interiores de todos os que exercem a sua liberdade no acto criativo.
Quero, por isso, congratular-me com a 16ª edição da Bienal de Cerveira, felicitar a autarquia e os demais responsáveis pela sua realização e homenagear aqueles que, há 33 anos, lançaram a semente e a quem se deve, em última instância, aquilo que a Bienal é hoje.
A todos, os meus sinceros parabéns.