Diplomacia Presidencial
Os constitucionalistas Gomes Canotilho e Vital Moreira publicaram, em 1991, um pequeno livro sobre “Os poderes do Presidente da República, especialmente em matéria de defesa e política externa”, o qual reproduz o parecer elaborado a pedido do então Presidente da República.
Os autores confirmam que compete ao Governo a condução da política externa, mas concluem que, na área das relações internacionais – tal como na da defesa –, “não é possível conduzir nenhuma política governamental eficazmente sem o Presidente da República e muito menos contra ele”.
O estatuto do Presidente da República no domínio das relações externas resulta das suas competências constitucionais específicas e das suas implicações implícitas. Representa a República, garante a independência nacional, nomeia os embaixadores, acredita os representantes diplomáticos estrangeiros, ratifica os tratados internacionais, declara a guerra e a paz.
Segundo aqueles constitucionalistas, “assumem especial profundidade os deveres governamentais de informação e consulta, bem como de consideração pelas opiniões do Presidente da República, pois nada do que interessa às relações externas – e à defesa – lhe pode ser alheio”. O Presidente da República é porta-voz “das posições do País, aquelas que estão acima das divergências de opinião acerca da política externa”, e está-lhe reservada “a formulação de convite a chefes de Estado para visitar o País”.
Mais do que em qualquer outra área, afirmam, as relações entre o Presidente da República e o Governo em matéria de política externa devem pautar-se por “um estrito respeito do princípio da lealdade institucional e um espírito de cooperação e concertação institucional”.
As revisões constitucionais que ocorreram depois da publicação do livro de Gomes Canotilho e Vital Moreira mantiveram inalteradas as competências explicitamente atribuídas ao Presidente da República. No entanto, assistiu-se, neste início do século XXI, a um reforço do papel do Presidente no domínio da política externa, de tal forma que esta é hoje uma das suas principais funções.
Por um lado, em resultado da globalização dos mercados e da intensificação da diplomacia económica. As empresas portuguesas, para assegurarem a sua sobrevivência, sentiram a necessidade de aumentar a sua presença em novos mercados, nomeadamente fora do espaço da União Europeia. O Programa de Assistência Económica e Financeira, subscrito com as instituições internacionais, em maio de 2011, tornou mais óbvia a importância estratégica do investimento privado e das exportações para o crescimento da economia portuguesa e o combate ao desemprego. Houve que estender a presença de Portugal a todos os países onde existissem potencialidades de aumento das nossas exportações e de captação de investimento.
Alargou-se assim a área geográfica exigindo contactos políticos ao mais alto nível, visando a valorização da imagem de Portugal no estrangeiro, o apoio à internacionalização da economia portuguesa e à difusão dos nossos produtos e o conhecimento das potencialidades do País na localização de investimentos produtivos. O Presidente da República reforçou o seu papel no desempenho dessa tarefa, em coordenação com o Governo, nomeadamente durante as suas deslocações a países estrangeiros e por ocasião das visitas a Portugal de outros Chefes de Estado.
A diplomacia económica, contudo, por mais importante que seja, é apenas uma das múltiplas vertentes da política externa que o Presidente da República promove durante as suas visitas ou quando recebe em Portugal altos dignitários de países estrangeiros.
A crise da dívida soberana da Zona Euro, o aprofundamento da União Económica e Monetária e o programa de ajustamento acordado pelo governo português com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional foram igualmente razões de reforço da ação presidencial no plano externo.
Antes de assumir as funções de Presidente da República, participei ativamente na construção da União Monetária Europeia e debrucei-me, em profundidade, sobre a sua dinâmica, tendo proferido múltiplas conferências no País e no estrangeiro, e até mesmo publicado dois livros.
Estava em condições para, nos contactos internacionais, me pronunciar sobre as questões de política europeia e a crise do euro, defendendo as orientações que mais se adequavam aos interesses nacionais. Foi assim, por exemplo, que defendi o aprofundamento da União Económica e Financeira, um papel mais ativo do BCE na estabilização da Zona Euro e na preservação da integridade da política monetária europeia, a criação de instrumentos de apoio aos países enfrentando dificuldades de financiamento e de uma efetiva União Bancária Europeia, assim como a adoção de uma agenda europeia de crescimento económico e criação de emprego.
Face à situação de emergência económica e financeira a que Portugal tinha chegado, houve que mobilizar toda a nossa capacidade diplomática, incluindo a ação do Presidente da República, para explicar, junto das mais variadas geografias, instituições internacionais e líderes políticos, a execução do programa de assistência financeira, em ordem a suscitar a confiança dos nossos parceiros e investidores, ganhar credibilidade no plano externo e conseguir apoios para as posições portuguesas. Fi-lo em dezenas de encontros.
Por outro lado, o aumento da importância das Forças Armadas como instrumento da política externa do Estado português, principalmente através da participação de contingentes em operações militares no exterior do território nacional, constituiu uma terceira razão do crescimento do papel do Presidente da República no domínio da política externa.
Nos termos da Lei de Defesa Nacional, o emprego de forças militares em operações no estrangeiro requer a concertação entre o Presidente da República, como Comandante Supremo das Forças Armadas e Presidente do Conselho Superior da Defesa Nacional, e o Governo.
O Presidente da República deve assim estar preparado para analisar a conformidade das propostas que lhe sejam apresentadas pelo Governo e pelo Chefe do Estado Maior das Forças Armadas com o interesse nacional e para defender as posições portuguesas nos seus contactos com entidades externas.
Durante os meus mandatos como Presidente da República, as Forças Armadas participaram em operações de manutenção da paz da ONU, da União Europeia e da NATO no Afeganistão, no Kosovo, na Bósnia-Herzegovina, no Líbano, na Somália, no Mali, na República Centro Africana, nos países bálticos, na Islândia e em Timor-Leste.
A atuação do Presidente da República no plano externo requer uma adequada coordenação e concertação com o Governo, de forma a assegurar a sintonia de posições entre os dois órgãos de soberania na defesa dos interesses nacionais. Nas suas linhas essenciais, a voz de Portugal, em matéria de política externa, deve ser a mesma, seja ela expressa pelo Presidente da República, pelo Primeiro-Ministro ou por outros membros do Governo.
A convergência de posições em matéria de política externa é realizada através de um processo que envolve vários intervenientes. São particularmente relevantes as reuniões do Presidente da República com o Primeiro-Ministro e com o Ministro dos Negócios Estrangeiros, os contactos regulares entre a Assessoria para as Relações Internacionais da Presidência da República com a Assessoria Diplomática do Primeiro-Ministro e com o gabinete do Ministro dos Negócios Estrangeiros, e as informações preparadas pelos serviços do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Face às mudanças verificadas nas duas últimas décadas, o exercício da diplomacia presidencial coloca hoje exigências acrescidas ao Presidente da República. Na era da globalização, o conhecimento dos dossiês, a capacidade de apresentação e de argumentação sobre os temas em agenda e a confiança suscitada junto dos interlocutores assumem tal importância na defesa dos interesses nacionais que as relações pessoais entre líderes políticos, embora importantes, deixaram de ser, por si só, suficientes.
Para além do conhecimento das regras básicas e especificidades que enformam o relacionamento entre Estados e da situação portuguesa nas suas múltiplas vertentes, o Presidente da República tem de ser capaz de dominar em toda a sua complexidade as relações bilaterais com os países com quem interage. Tem de ser capaz de abordar, com conhecimento de causa, os assuntos políticos, económicos, sociais, militares, científicos, culturais e ambientais, assim como as questões de política europeia, que correspondam aos interesses do País, e identificar as mensagens relevantes que devem ser transmitidas.
Por outro lado, o Presidente da República não pode deixar de ter um bom conhecimento dos aspetos essenciais da situação dos países com quem Portugal mantém relações históricas e culturais privilegiadas e tem de ser capaz de abordar as grandes questões de política internacional da atualidade e sobre elas estar informado do posicionamento dos seus interlocutores.
É por tudo isto que, nos tempos que correm, os interesses de Portugal no plano externo só podem ser eficazmente defendidos por um Presidente da República que tenha alguma experiência no domínio da política externa e uma formação, capacidade e disponibilidade para analisar e acompanhar os dossiês relevantes para o País.
As visitas do Presidente da República ao estrangeiro e as dos Chefes de Estado estrangeiros a Portugal constituem momentos privilegiados do exercício da diplomacia presidencial. Nesses encontros, o Presidente da República promove e faz-se acompanhar não só por empresários e parceiros sociais, mas também por agentes da vida cultural e académica, procurando sempre contactar e dar visibilidade às comunidades portuguesas.
Neste ano do meu mandato, visitaram oficialmente Portugal os Chefes de Estado de Singapura, México, Alemanha, Moçambique, Espanha e Indonésia. Em Braga, teve lugar o X Encontro do Grupo de Arraiolos, com a presença de Chefes de Estado europeus.
Pela minha parte, visitei oficialmente a China, a Coreia do Sul e os Emirados Árabes Unidos e participei na X Cimeira da CPLP, em Timor, e na XXIV Cimeira Ibero-Americana, no México.
Singapura
Em maio de 2014, recebi em Visita de Estado a Portugal o Presidente de Singapura, Dr. Tony Tan, retribuindo a visita que tinha efetuado a Singapura, em maio de 2012. Foram as primeiras visitas entre os dois países ao nível de Chefes de Estado.
O objetivo principal consistiu no aprofundamento das relações comerciais e de investimento entre os dois países e dar a conhecer aos empresários singapurenses as potencialidades de Portugal como membro da União Europeia e país que mantém relações especiais com África e a América Latina.
Durante a visita, os empresários portugueses tiveram oportunidade de estabelecer contactos frutuosos com os membros da delegação empresarial que acompanhava o Presidente de Singapura.
Singapura, que detém um elevado poder de compra, é o principal mercado das exportações portuguesas no conjunto dos países da ASEAN e uma importante plataforma para a penetração nos mercados asiáticos. Singapura é a segunda maior praça financeira mundial no que respeita a transações em moeda chinesa.
No domínio do investimento, a visita do Presidente Tony Tan tinha um propósito específico: contribuir para acelerar as negociações entre a PSA International – um dos cinco maiores operadores portuários do mundo – e a Administração do Porto de Sines e as autoridades portuguesas para a extensão do Terminal XXI de contentores do Porto de Sines.
Pretendia-se reforçar a importância estratégica do Porto de Sines como via de entrada na Europa, tendo presente o alargamento do Canal do Panamá e a perspetiva de ligação ferroviária rápida entre Sines e Espanha.
Esta era uma questão que, durante a minha visita a Singapura, em 2012, já tinha sido abordada no encontro com o Presidente Tony Tan e fora objeto de compromisso da parte do Presidente da PSA, que reconhecera o potencial do porto de águas profundas de Sines.
Na véspera da visita do Presidente de Singapura a Portugal alcançou-se o acordo que permitiu a assinatura de um Memorando de Entendimento para a extensão do terminal de contentores de Sines.
No que se refere à agenda política da visita, de destacar o apoio manifestado por Portugal à adesão de Timor-Leste à ASEAN, conhecidos que eram os obstáculos colocados por Singapura, tendo sido sublinhados os esforços desenvolvidos por Timor-Leste para exercer a presidência da CPLP a partir do mês de julho seguinte.
Ao mesmo tempo, foi manifestado o apoio de Portugal às negociações entre a União Europeia e Singapura para o estabelecimento de um Acordo de Parceria e Cooperação e de um Acordo de Comércio Livre.
China
A Visita de Estado à República Popular da China, em maio de 2014, a convite do Presidente Xi Jinping, foi uma das mais importantes dos meus mandatos como Presidente da República.
Em 2014, celebraram-se 35 anos de sucesso nas relações diplomáticas entre os dois países e 15 anos sobre a transferência para a China da administração de Macau.
A visita foi cuidadosamente preparada no sentido de contribuir para o aprofundamento, nos planos político, económico, científico e cultural, da parceria estratégica entre Portugal e a China estabelecida em 2005.
Acompanharam-me o Vice-Primeiro-Ministro e os Ministros dos Negócios Estrangeiros, da Economia e da Educação e Ciência, cinco deputados dos partidos representados na Assembleia da República, dirigentes de oito Universidades e Institutos Politécnicos e uma importante delegação empresarial.
O ponto alto da visita foi a reunião de trabalho com o Presidente Xi Jinping, no Grande Palácio do Povo, no dia 16 de maio, depois das coloridas cerimónias de boas-vindas na Praça Tiananmen. A reunião decorreu num clima de grande abertura e simpatia, para o que contribuiu o facto de, como Primeiro-Ministro, em 1987, em Pequim, ter sido o signatário do acordo sobre a transferência da administração de Macau para a China, cujo processo sempre foi visto como muito positivo e fonte de confiança política entre os dois países. Acrescia o facto de eu ser o único político europeu em exercício que se tinha encontrado com Deng Xiaoping. “Um velho amigo da China”, para utilizar as palavras dos meus interlocutores políticos.
Passámos em revista as relações bilaterais nos domínios político, comercial e de investimento, científico e cultural, sendo reconhecido o espírito de amizade, confiança e respeito mútuo que as tem marcado.
Discutimos a possibilidade de desenvolvimento de novas áreas de cooperação, como a economia do mar, a proteção ambiental, as energias renováveis, o turismo, a ciência e o ensino do português.
A cooperação triangular, principalmente com países com os quais Portugal mantém fortes relações histórias e culturais, foi igualmente objeto de análise.
O Presidente da China manifestou forte empenho em aprofundar e fortalecer as relações entre os dois países.
As conversações incidiram igualmente sobre a Agenda 2020 para a parceria estratégica entre a União Europeia e a China, estabelecida em 2013, assim como sobre a situação económica europeia e as mudanças na Zona Euro visando assegurar a estabilidade financeira, incluindo a criação da União Bancária.
Houve também uma interessante troca de impressões sobre as reformas económicas levadas a cabo na China, as perspetivas futuras da economia chinesa, nomeadamente sobre o denominado “sonho chinês” do Presidente Xi, e as questões políticas da agenda internacional.
O Presidente Xi Jinping felicitou Portugal pelo esforço desenvolvido para corrigir os desequilíbrios económicos e financeiros e pela conclusão bem-sucedida do programa de assistência financeira negociado em 2011 com as instituições internacionais.
O mesmo espírito positivo e amistoso esteve presente nas reuniões que mantive com o Primeiro-Ministro Li Keqiang, com o Presidente do Congresso do Povo, Zhang Dejiang, e com o Presidente da Câmara de Xangai.
A troca de pontos de vista sobre assuntos de interesse comum com o Presidente Xi Jinping continuou, de modo mais informal, durante o banquete que ofereceu à comitiva portuguesa.
Testemunhámos a assinatura de três acordos entre governos e cinco acordos entre empresas, a que se seguiu uma conferência de imprensa conjunta, em que o Presidente Xi teve palavras de elogio a Portugal e proferiu declarações que, segundo o nosso embaixador em Pequim, configuram “orientações políticas de líder” para as relações entre a China e Portugal.
A visita foi programada de forma a que o desenvolvimento das relações comerciais e de investimento entre Portugal e a China tivesse um lugar de particular relevo.
A China apresenta-se, de facto, como um país com um grande potencial de expansão para novas exportações e para a captação de fluxos turísticos. Dada a dimensão do mercado chinês, um pequeno ganho de quota de mercado traduz-se num grande impulso às exportações portuguesas.
Daí a integração do Ministro da Economia na comitiva e a presença de destacados empresários portugueses com vocação exportadora e interessados em encontrar interlocutores chineses.
Nesse sentido, proferi intervenções em dois Seminários Económicos, um em Xangai e outro em Pequim, e estive presente em três pequenos-almoços de trabalho – em Xangai, Pequim e Macau – com grandes empresários chineses com propensão para investir na Europa.
Em Macau, associei-me aos esforços desenvolvidos pela Câmara de Comércio Luso-Chinesa na promoção dos contactos entre empresários portugueses e macaenses. Foram ocasiões para evidenciar as potencialidades de Portugal como localização competitiva para o investimento internacional e as vantagens que resultariam de uma ligação aérea direta entre os dois países.
Os empresários portugueses tiveram oportunidade de realizar múltiplos contactos com empresários chineses, que consideraram muito proveitosos. Foram assinados dez memorandos de entendimento entre empresas portuguesas e chinesas.
A visita, que foi considerada o maior esforço alguma vez feito para impulsionar as relações comerciais, de turismo e de investimento com a China, teve também uma importante componente científica e cultural.
Em Xangai, na Universidade de Estudos Internacionais, participei no colóquio sobre “O valor económico das línguas”, que contou com a participação de especialistas portugueses e chineses, e visitei o Instituto de Matéria Médica, onde testemunhei a assinatura de um memorando de entendimento com uma empresa de biotecnologia portuguesa.
Em Pequim, na Universidade de Estudos Estrangeiros, proferi uma conferência sobre Portugal para estudantes de língua portuguesa (a quem, anteriormente, a minha mulher tinha dado uma aula sobre a poesia de Sophia de Mello Breyner e de Luís Vaz de Camões). Em Macau visitei a Universidade, o Instituto Politécnico e a Escola Portuguesa.
Foram intensos os contactos entre os representantes das universidades portuguesas e os seus congéneres chineses, tendo sido assinados quinze memorandos de entendimento entre universidades e instituições de investigação dos dois países, a maior parte sobre cooperação no ensino de língua portuguesa.
Foi com emoção que presenciei, em Pequim e em Xangai, o entusiasmo com que um elevado número de estudantes se dedicava ao estudo da nossa língua e da nossa cultura.
Em Macau, encontrei um empenho na preservação e divulgação da língua portuguesa que ultrapassou as minhas expectativas.
O interesse crescente pelo estudo da nossa língua, que testemunhei durante a minha visita à China, é um claro sinal do seu valor económico e internacional e da sua capacidade de afirmação como língua de cultura, de ciência e de empreendedorismo.
Em Xangai, encontrei-me com a comunidade portuguesa, mulheres e homens entusiasmados com a experiência que estavam a viver, empenhados em atuar como embaixadores de Portugal na divulgação dos nossos produtos e da nossa riqueza turística.
A visita terminou em Macau, num clima de calorosa hospitalidade. Tive a oportunidade de constatar que a secular presença cultural portuguesa continua a ser valorizada e que são especiais os laços que nos ligam àquele território. A transição da administração de Macau para a China, a que me encontro profundamente ligado, marcou o início de uma nova fase do relacionamento entre os dois países, baseada na confiança, no respeito mútuo e na cooperação.
No final da Visita de Estado à República Popular da China, a delegação portuguesa tinha o sentimento de que os objetivos tinham sido plenamente conseguidos e que a parceria estratégica luso-chinesa havia sido elevada a um novo patamar.
México
Em junho de 2014, recebi, em Visita de Estado a Portugal, o Presidente do México, Enrique Peña Nieto, que se fez acompanhar por vários ministros e por uma expressiva delegação empresarial. Foi uma visita que se revelou bastante frutuosa, consolidando aquele país como um parceiro de futuro para Portugal.
O objetivo da visita era dar um impulso político às relações económicas entre Portugal e o México, por ocasião da celebração dos 150 anos do estabelecimento de relações diplomáticas entre os dois países.
O México, com 122 milhões de habitantes, é o segundo país mais populoso da América Latina, membro do G20 e da Aliança do Pacífico – em que Portugal tem o estatuto de observador –, parceiro de Portugal na Conferência Ibero-Americana e está ligado à União Europeia por um Acordo de Comércio Livre. A sua economia é a 15ª a nível mundial.
O governo do Presidente Peña Nieto tinha lançado um ambicioso programa de reformas estruturais, incluindo a liberalização dos setores da energia e das telecomunicações.
As exportações portuguesas para o México registaram, nos últimos anos, um apreciável dinamismo e os empresários portugueses veem no mercado mexicano um grande potencial de expansão, com oportunidades que tinham o maior interesse em aproveitar.
As questões económicas dominaram as conversações que mantive com o Presidente Peña Nieto e com ele participei num Seminário Económico que reuniu um número muito elevado de empresários dos dois países e em que foi visível um ambiente e uma vontade muito favoráveis à identificação e desenvolvimento de oportunidades de negócio e parcerias mutuamente vantajosas. O Seminário foi, como se pretendia, um dos pontos altos da visita.
Alemanha
O meu primeiro encontro com o Presidente Joachim Gauck da República Federal da Alemanha teve lugar na Polónia, em Cracóvia, durante a realização do IX Encontro do Grupo de Arraiolos, em outubro de 2013.
Falei-lhe então da execução do programa de ajustamento subscrito por Portugal em 2011, das suas consequências económicas e sociais e das relações bilaterais entre os nossos dois países. Convidei o Presidente Gauck a visitar Portugal.
A Visita de Estado do Presidente Gauck teve lugar em junho de 2014.
Correspondendo ao interesse manifestado por Portugal, o Presidente da Alemanha fez-se acompanhar por uma importante delegação empresarial.
Queríamos aproveitar a ocasião para dar a conhecer aos empresários alemães as potencialidades de Portugal, as oportunidades de investimento, a qualidade da nossa mão-de-obra e das infraestruturas físicas e tecnológicas e as relações especiais que mantemos com países africanos.
A Alemanha, a maior economia da União Europeia, é o nosso segundo maior parceiro comercial e um dos mais importantes investidores externos.
Era de todo o interesse que o tecido económico alemão conhecesse melhor o sucesso das empresas alemãs instaladas há anos em Portugal, como a Autoeuropa, a Bosch, a Siemens, a Leica, a Continental, entre outras.
Foram intensos os contactos entre empresários portugueses e alemães propiciados pela visita do Presidente Gauck. Participámos ambos no encerramento dos trabalhos da Conferência comemorativa dos 60 anos da Câmara de Comércio Luso-Alemã e visitámos a fábrica da Autoeuropa, em Palmela.
Na intervenção que proferiu, o administrador da Volkswagen que nos recebeu confirmou o investimento numa nova linha de montagem para produzir, na fábrica de Palmela, um novo modelo de automóvel.
Nas conversações que mantive com o Presidente Gauck, tivemos ocasião de abordar, além das relações comerciais e de investimento entre os dois países, a cooperação com a Alemanha no domínio da formação profissional e o apoio da instituição bancária alemã KFW à criação da Instituição Financeira para o Desenvolvimento.
No que se refere à agenda europeia, procurei sensibilizar o Presidente alemão para a necessidade de se avançar mais decisivamente na promoção do crescimento económico e do emprego, em paralelo com o processo de disciplina e supervisão orçamental, assim como na operacionalização da União Bancária, de modo a combater a fragmentação dos mercados de crédito, e na melhoria das interligações energéticas entre a Península Ibérica e o resto da Europa.
Estou convencido de que esta visita teve grande relevância para a afirmação da imagem positiva de Portugal na Alemanha.
Moçambique
O Presidente da República de Moçambique, Armando Guebuza, visitou Portugal em julho de 2014, quatro meses depois da realização em Maputo da II Cimeira entre Portugal e Moçambique.
Para além da cooperação bilateral nas áreas da economia, da educação, da cultura, da comunicação social e da circulação de pessoas, três pontos devem ser sublinhados nas conversações que mantive com o Presidente Guebuza: as negociações entre o governo moçambicano e a Renamo, a situação da Guiné-Bissau e a CPLP.
Apoiei e estimulei as negociações de paz entre o governo e a Renamo, visando pôr fim às confrontações, com perdas de vidas, que se verificavam havia cerca de um ano, e a criação de condições para que Afonso Dhlakama abandonasse a reserva da Gorongosa e regressasse a Maputo e para que a realização das eleições presidenciais e legislativas, marcadas para 15 de outubro, se processasse num clima de tranquilidade e pluralismo.
Manifestei ao Presidente Guebuza a disponibilidade de Portugal para participar no processo de consolidação dos acordos que viessem a ser estabelecidos, se fosse essa a vontade das partes.
No princípio de setembro, respondi positivamente ao pedido do Presidente Guebuza para a inclusão de dois oficiais portugueses na equipa de observadores internacionais do processo de cessar-fogo negociado entre o governo moçambicano e a Renamo.
No que se refere à Guiné-Bissau, defendi a necessidade de um forte apoio da comunidade internacional às novas autoridades escolhidas nas eleições presidenciais e legislativas que marcaram o fim da violação da ordem constitucional provocada pelo golpe militar de abril de 2012. O caminho da estabilização e do desenvolvimento económico e social da Guiné-Bissau exige a concretização das reformas das forças armadas e de segurança, da administração pública e do sistema de justiça, sendo necessário apoio financeiro e também garantias de proteção das instituições legítimas do país. Nesse sentido, Portugal defendia a colocação no terreno de uma força internacional de estabilização, com mandato das Nações Unidas.
Tive ainda ocasião de abordar com o Presidente Guebuza algumas das questões que estavam na ordem do dia da CPLP, cuja presidência era exercida por Moçambique, como a aposta na língua portuguesa e a sua internacionalização e a agenda da Cimeira a ter lugar em Díli, em julho de 2014.
Em janeiro de 2015, desloquei-me a Maputo para representar o Estado português nas cerimónias de investidura do novo Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, tendo sido acompanhado pelo Vice Primeiro-Ministro e pelo Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.
A presença nacional ao mais alto nível, num momento de particular importância da vida de Moçambique, foi, acima de tudo, o testemunho da importância que Portugal atribui às relações políticas e à cooperação económica, empresarial e cultural com aquele país de língua oficial portuguesa e à consolidação das suas instituições democráticas.
As reuniões de trabalho que mantive com o Presidente Guebuza e, seguidamente, com o Presidente Nyusi confirmaram a vontade política e o ambiente favorável ao aprofundamento das relações entre Portugal e Moçambique, assim como o empenho no diálogo com os partidos da oposição, de modo a consolidar a paz e a estabilidade política.
Aproveitei a ocasião para promover um encontro com um grupo de empresários portugueses que exercem atividades em Moçambique e para visitar uma fábrica de têxteis em Marracuene, produto de uma parceria entre empresários portugueses e moçambicanos. De todos, recolhi perspetivas positivas quanto ao desenvolvimento futuro das relações comerciais e de investimento entre os dois países.
Em Maputo, encontrei-me com a comunidade portuguesa e visitei o Instituto do Coração, um bom exemplo da nossa cooperação na área da saúde, levado a cabo, acima de tudo, pela ONG Cadeia da Esperança e que irá contar com o apoio do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua para a formação de pessoal médico especializado na área da cardiologia.
Participei ainda num almoço informal com destacados elementos da vida política moçambicana que conheci no exercício das minhas funções públicas.
Espanha
Foi com inegável satisfação que recebi a chamada telefónica do Príncipe Filipe de Espanha dizendo-me que gostaria que fosse Portugal o destino da sua primeira visita a um país da União Europeia e da Ibero-América, após a sua proclamação como Rei de Espanha.
A visita do Rei Filipe VI de Espanha e da Rainha Letícia, que se fizeram acompanhar pelo Ministro das Relações Exteriores, e que revestiu a forma de Visita de Apresentação, teve lugar no dia 7 de julho de 2014 e assumiu um significado muito particular.
Tratou-se da confirmação, ao mais alto nível do Estado, da solidez e profundidade das relações entre dois países vizinhos e amigos nos mais variados domínios. O novo monarca deu plena continuidade ao legado deixado por seu pai, D. Juan Carlos, no que se refere ao contributo para que portugueses e espanhóis se conhecessem melhor e se empenhassem em trabalhar em conjunto na defesa de interesses comuns.
Coreia do Sul
Fui o primeiro chefe de Estado português a visitar oficialmente a República da Coreia do Sul. A visita teve lugar em julho de 2014 e foi articulada com a minha deslocação a Timor-Leste para participar na X Cimeira da CPLP. Acompanharam-me os Secretários de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Adjunto e da Economia e do Ensino Superior, uma delegação empresarial e vários Reitores de universidades portuguesas.
Em maio de 2011, tinha recebido em Lisboa, no quadro da celebração dos 50 anos de relações diplomáticas entre os dois países, a atual Presidente da Coreia do Sul, Park Geun-hye, como enviada especial do então Presidente Lee Myung-bak.
As relações políticas, económicas e culturais entre Portugal e a Coreia do Sul eram muito esparsas, assim como o conhecimento recíproco entre os dois povos.
O objetivo prioritário da visita consistia em reforçar as relações políticas, dar a conhecer as potencialidades económicas de Portugal e abrir portas para o incremento das exportações portuguesas.
A minha reunião com a Presidente da República da Coreia do Sul decorreu num ambiente de grande cordialidade e manifesto empenho no reforço das relações entre os dois países.
Naturalmente, comecei por expressar a solidariedade do povo português face à tragédia do naufrágio do ferry Sewol, em que perderam a vida mais de 300 pessoas, muitas delas jovens estudantes.
No domínio económico, foram avaliadas as possibilidades de os empresários dos dois países tirarem melhor partido do acordo de comércio livre entre a União Europeia e a Coreia do Sul e de estabelecerem parcerias visando terceiros mercados, assim como as perspetivas de evolução das economias europeia e asiática.
A Presidente Park expôs-me a sua visão as relações com a Coreia do Norte e as perspetivas para a reunificação da Península da Coreia, na linha do discurso que havia proferido, em março, na Universidade de Dresden. Reafirmei a posição portuguesa relativamente às ameaças à paz e à segurança internacionais provindas da Coreia do Norte.
No final da reunião, foram assinados entre os dois governos um memorando de entendimento sobre cooperação na área do turismo e um outro sobre cooperação em matéria de energias renováveis e eficiência energética.
A Coreia do Sul é um país de 50 milhões de habitantes, membro do G20, a 14ª maior economia do mundo, tecnologicamente muito avançada, competitiva e com um forte dinamismo empresarial.
Sendo as relações comerciais e de investimento entre Portugal e a Coreia do Sul pouco significativas, justificava-se um esforço visando alterar esta situação.
Nesse sentido, participei num encontro de trabalho com líderes de grandes empresas sul-coreanas, com o objetivo de apresentar Portugal como uma localização atrativa para as empresas interessadas em investir na Europa.
Por outro lado, participei na abertura de um Seminário Económico destinado a potenciar as parcerias entre empresas portuguesas e coreanas.
Verificaram-se manifestações de interesse em investimentos da parte de empresas sul coreanas e os empresários portugueses realizaram contactos que consideraram frutuosos.
A visita incluiu também uma componente académica. Participei num encontro entre Reitores das universidades portuguesas e sul-coreanas, tendo sido assinados cinco protocolos de cooperação nas áreas científica e de ensino da língua portuguesa.
Pode dizer-se que foram criadas as condições para, com um adequado seguimento por parte da diplomacia económica e dos dois governos, passar para um patamar mais elevado de relacionamento entre Portugal e a Coreia do Sul.
X Cimeira da CPLP
Em julho de 2014, depois da visita oficial à Coreia do Sul, desloquei-me a Díli para chefiar a delegação portuguesa à X Cimeira da CPLP. A comitiva incluía o Primeiro-Ministro e o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
Embora o tema da cimeira fosse “A CPLP e a Globalização”, toda a atenção estava concentrada no ponto da agenda relativo ao pedido de adesão da Guiné Equatorial.
Desde há meses que este era o assunto dominante na comunicação social portuguesa, suscitando forte hostilidade. Eram muitos aqueles que reclamavam que Portugal vetasse a adesão da Guiné Equatorial à CPLP.
Tratava-se um dossiê que conhecia bem.
Tinha estado presente na Cimeira da CPLP de Bissau, em 2006, em que a Guiné Equatorial tinha sido aceite como observador associado.
Tinha estado também presente nas cimeiras de Luanda, em 2010, e de Maputo, em 2012, em que tinha sido debatido o pedido de adesão apresentado pela Guiné Equatorial, tendo então Portugal manifestado a sua oposição. Apesar de algumas divisões entre os membros da CPLP, foi possível, tanto em Luanda como em Maputo, alcançar o compromisso de que a Guiné Equatorial não preenchia os requisitos necessários para a adesão.
Em março de 2011, foi estabelecido um roteiro, incluindo cinco planos de ação, que a Guiné Equatorial deveria cumprir tendo em vista a sua adesão à CPLP.
Em fevereiro de 2014, o Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros da CPLP, reunido em Maputo, perante os avanços na implementação do roteiro, reportados por missões da CPLP a Malabo, recomendou à cimeira de Chefes de Estado e de Governo, a realizar em Timor-Leste, a adesão da Guiné Equatorial como membro de pleno direito.
Fruto das pressões que Portugal vinha a exercer, o Ministro das Relações Exteriores e da Cooperação da Guiné Equatorial anunciou, no Conselho de Ministros de Maputo, a aprovação de uma moratória sobre a pena de morte que vigorava naquele país. Já antes a língua portuguesa tinha sido adotada como língua oficial.
Foi este o quadro que antecedeu a cimeira de Díli, em que todos os Estados-membros, com exceção de Portugal, apoiavam fortemente a adesão da Guiné Equatorial à CPLP.
Portugal apresentou-se em Díli, como se impõe em política externa, com uma posição concertada entre o Presidente da República e o Governo, na sequência de uma análise aprofundada sobre a questão da adesão da Guiné Equatorial.
Sendo a adesão fortemente apoiada pelos países africanos de língua oficial portuguesa, pertencentes ao mesmo espaço regional que a Guiné Equatorial, a que se juntava o Brasil e Timor-Leste, um veto de Portugal poderia, no limite, pôr em causa a própria sobrevivência da CPLP.
Ora, a CPLP é um ativo estratégico para Portugal, tal como a Commonwealth o é para o Reino Unido e a Organização da Francofonia para a França.
Porque tem na sua base a língua portuguesa, a CPLP assume para Portugal, mais do que para qualquer outro país, um superior interesse estratégico.
Posso testemunhar, pelos contactos com Presidentes da República e governantes de outros países, como a existência de uma Comunidade de 250 milhões de cidadãos, que se distingue e identifica pela língua portuguesa, fortalece a posição de Portugal no plano internacional.
Isolando-se face à vontade conjugada de todos os outros Estados-membros, numa comunidade em que o multilateralismo deve prevalecer sobre o unilateralismo, Portugal veria ainda a sua posição dificultada pelo facto de ser o antigo poder colonial europeu.
Por outro lado, Portugal não podia deixar de ter presente que a cimeira de Díli marcava o início da presidência timorense da CPLP, a primeira vez que Timor-Leste era chamado a desempenhar uma tarefa de tal dimensão internacional.
Tendo existido um grande empenho das autoridades timorenses na adesão da Guiné Equatorial, um veto português significaria o fracasso da cimeira, com elevados danos reputacionais para Timor-Leste.
A Cimeira de Díli era vista, aliás, como um teste à capacidade de Timor-Leste para satisfazer as exigências da participação na ASEAN, a que era candidato.
As autoridades timorenses tinham convidado para estarem presentes nas cerimónias de abertura e encerramento da Cimeira de Díli e a tomarem a palavra representantes da ASEAN e de seus Estados-membros, como a Indonésia e Singapura.
O insucesso da cimeira seria um golpe nos esforços de Timor-Leste para reforçar a sua credibilidade internacional.
Neste quadro, uma questão não podia deixar de ser colocada: como reagiria Timor-Leste em relação a Portugal, encarado como o responsável pelo fracasso da Cimeira?
Qual o efeito que isso teria sobre a difusão da língua portuguesa em Timor?
Surpreende que muitos dos que defenderam ativamente o veto de Portugal à adesão da Guiné Equatorial tivessem ignorado os danos para Timor-Leste de uma tal decisão.
A estratégia de Portugal para a Cimeira de Díli não podia ser a de isolamento em relação a todos os outros Estados-membros. A contestação organizada por alguns setores da sociedade portuguesa contra a adesão da Guiné Equatorial devia ser relativizada, porque contrária aos superiores interesses do País e pelos danos que provocaria a Timor-Leste, país a que nos ligam profundos laços de amizade e que temos o dever de apoiar nos seus esforços de promoção do desenvolvimento económico e social.
Foi por tudo isto que, em Díli, insisti, tal como o Primeiro-Ministro e o Ministro dos Negócios Estrangeiros, na defesa dos princípios fundadores da CPLP: a língua portuguesa, o primado da paz, do Estado de direito, da democracia, do respeito pelos direitos humanos e da justiça social.
Devia ficar muito claro que a adesão da Guiné Equatorial não significava a descaracterização dos princípios fundamentais em que assenta a CPLP.
Foi nesse sentido que, por insistência de Portugal, ficou expresso nas conclusões da Cimeira que a Guiné Equatorial devia dar novos passos na implementação do programa de adesão e no cumprimento das obrigações estatutárias da CPLP, incluindo a passagem da moratória para a abolição da pena de morte. Estes compromissos foram assumidos pelo Presidente da República da Guiné Equatorial na intervenção que proferiu perante os representantes dos Estados-membros.
O Presidente Taur Matan Ruak comunicou-me a sua intenção de nomear o antigo Presidente timorense, José Ramos Horta, para monitorizar e apoiar a adoção, por parte da Guiné Equatorial, das disposições estatutárias da CPLP.
Na Cimeira de Díli foi ainda adotado o Plano de Ação de Lisboa para a internacionalização da língua portuguesa e foram eleitos, como novos Observadores Associados da CPLP, a Namíbia, a Turquia, o Japão e a Geórgia.
Por outro lado, a Cimeira ficou marcada pelo lançamento da Nova Visão Estratégica da CPLP, procurando identificar respostas aos desafios que se colocam à Comunidade no início da sua terceira década de existência, num momento em que o seu potencial no domínio económico vai despertando um interesse crescente junto de outros Estados.
A Cimeira de Díli da CPLP distinguiu-se ainda pelo regresso pleno da Guiné-Bissau à organização, de que tinha sido suspensa na sequência do golpe militar de abril de 2012.
Indonésia
Em setembro de 2014, o Presidente da República da Indonésia, Susilo Bambang Yudhoyono, realizou uma Visita de Estado a Portugal, acompanhado por vários ministros e uma delegação empresarial.
Tinham passado 54 anos sobre a primeira visita de um Chefe de Estado indonésio, o Presidente Sukarno, a Portugal.
Encontrara o Presidente Yudhoyono em maio de 2012, durante as cerimónias do décimo aniversário da independência de Timor-Leste. Daí parti para Jacarta, para a realização da primeira visita de um Chefe de Estado português à Indonésia. Fui acompanhado pelo Vice-Primeiro Ministro e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros e por um grupo de empresários.
O objetivo principal destas duas visitas de Estado – a minha à Indonésia, em 2012, e a do Presidente Yudhoyono a Portugal, em 2014 – foi a completa normalização das relações entre os dois países, construindo um quadro favorável ao desenvolvimento das relações económicas e culturais orientado para o futuro.
Portugal tinha rompido relações diplomáticas com a Indonésia em 1975, aquando da invasão de Timor-Leste. As relações diplomáticas estiveram suspensas durante 24 anos e só foram restabelecidas em dezembro de 1999, na sequência do referendo timorense favorável à independência do território.
O objetivo político das duas visitas de Estado foi plenamente atingido. Processaram-se num clima particularmente amistoso e construtivo. Foi um verdadeiro virar de página nas relações entre Portugal e a Indonésia.
Foram sublinhados os laços históricos e culturais multisseculares entre os dois povos, patentes, de resto, no elevado número de palavras de origem portuguesa que integram a língua indonésia.
As divergências do passado sobre Timor-Leste foram, por assim dizer, enterradas e substituídas pelo interesse comum em desenvolver uma cooperação para o desenvolvimento económico e social daquele jovem país de língua oficial portuguesa e em apoiar a sua adesão à ASEAN. No mesmo sentido foi perspetivada a aproximação da Indonésia à CPLP.
A agenda económica ocupou também lugar de relevo nas conversações com o Presidente Yudhoyono.
A Indonésia é o 4º país mais populoso do mundo – trata-se da maior democracia muçulmana, do maior mercado do Sudoeste asiático, do país com o segundo maior crescimento económico entre os membros do G20 e que exerce uma posição de liderança no ASEAN.
Era, por isso, indiscutível o interesse português em intensificar as relações comerciais com a Indonésia, tendo sido identificadas áreas para o desenvolvimento de parcerias mutuamente benéficas e promovidos contactos entre empresários portugueses e indonésios.
X Encontro do Grupo de Arraiolos
Nos últimos dias de setembro de 2014, acolhi, em Braga, no Mosteiro de Tibães, o X Encontro dos Chefes de Estado do Grupo de Arraiolos, criado pelo Presidente Jorge Sampaio, em 2003.
Estiveram presentes os Presidentes da República da Alemanha, Áustria, Polónia, Finlândia, Hungria, Letónia, Estónia e Bulgária.
O objetivo dos encontros anuais do Grupo de Arraiolos é debater, de modo informal, assuntos relevantes da agenda europeia.
Escolhi três temas de grande atualidade europeia para este X Encontro do Grupo de Arraiolos: a energia, a imigração e o papel da investigação e inovação na promoção do crescimento e da competitividade e emprego.
Face às oportunidades de intervenção sobre as questões europeias de que hoje dispõem os Chefes de Estado, os debates e trocas de pontos de vista que tiveram lugar em Braga revelaram-se extremamente proveitosos.
À margem do Encontro, tive ainda reuniões bilaterais com os Presidentes da Finlândia, da Bulgária e da Estónia.
A apresentação do tema da energia, que tinha ganho forte relevância geopolítica no seguimento da crise da Ucrânia, coube ao Presidente da Polónia, Borislav Komorowski.
Apenas quatro países da União Europeia não dependem do gás da Rússia – Portugal, Espanha, Irlanda e Reino Unido – e, em seis deles, a dependência atinge 100 por cento. A energia apresenta-se assim como uma vulnerabilidade da União Europeia e a diversificação das fontes de abastecimento e a criação do mercado interno europeu de energia são questões vitais.
A melhoria das interconexões energéticas entre a Península Ibérica e as redes europeias é uma questão da maior importância para Portugal, tendo mesmo dado lugar a uma declaração conjunta com a Espanha e a Polónia apresentada ao Conselho Europeu.
Nesse sentido, o encontro do Grupo de Arraiolos foi aproveitado para demonstrar como a Península Ibérica poderia contribuir para reduzir em 40 por cento as importações de gás da Rússia, tendo mesmo sido distribuído às diferentes delegações um documento sobre o assunto preparado pelo Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia.
Coube-me fazer a apresentação do tema da imigração, igualmente um tópico central do debate europeu.
Todos tinham presente a pressão dos fluxos migratórios vindos dos países do Mediterrâneo Sul que a União Europeia tem vindo a enfrentar e as imagens dramáticas dos naufrágios dos barcos de imigrantes da Líbia, da Síria, do Sudão e da Faixa de Gaza, tentando alcançar as costas da Europa.
Por outro lado, era sabido que, além do fenómeno da imigração, se colocam graves questões, como o tráfico de seres humanos e de droga, o contrabando de armas, o crime organizado e o terrorismo.
Ficou claro do debate que o tema das migrações, sendo complexo, exige da União Europeia uma abordagem multidisciplinar em torno de três eixos prioritários: a gestão da migração legal, o combate à imigração ilegal e o diálogo com os países terceiros de origem e trânsito dos migrantes.
A apresentação do tema da Investigação e Inovação coube ao Presidente da República da Finlândia, Sauli Niinistö. A relevância do tema é óbvia, ainda mais numa Europa em que, após anos de estagnação económica e de aumento do desemprego, os sinais de recuperação se vislumbram ainda ténues e frágeis. Apesar dos progressos realizados, a União Europeia, em matéria de inovação, continua atrás dos EUA, da Coreia do Sul e do Japão, e a China recupera terreno rapidamente.
Para a generalidade dos países europeus, os avanços tecnológicos e a inovação, a transformação dos resultados científicos em novos produtos, serviços e processos são vistos como decisivos para o aumento da produtividade e a melhoria da competitividade e, consequentemente, para o crescimento económico e a criação de emprego.
Foi reconhecido o potencial que o aumento significativo do Orçamento do Programa Horizonte 2020 representava para a promoção da Investigação e Inovação a nível europeu.
O encontro de Braga constituiu uma oportunidade para dar a conhecer aos oito presidentes e às suas delegações o Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia, onde trabalham cientistas de 18 países, e a sua ligação ao empreendedorismo empresarial.
Emirados Árabes Unidos
Com a minha deslocação aos Emirados Árabes unidos, em novembro de 2014, realizou-se a primeira visita oficial de um Chefe de Estado português àquele país, a que nos liga um passado histórico de cinco séculos.
Fui acompanhado pelo Vice-Primeiro Ministro, pelo Secretário de Estado das Comunidades e por um significativo grupo de empresários.
A anteceder a visita, teve lugar a primeira comissão mista entre Portugal e os Emirados, sendo a delegação portuguesa presidida pelo Vice-Primeiro-Ministro.
Na programação da visita tinham sido identificadas duas vertentes principais, a política e a económica, que, em boa parte, se interligavam.
A minha reunião com o Príncipe Herdeiro do Abu Dhabi e Presidente em exercício dos Emirados Árabes Unidos, Xeque Mohammed bin Zayed al Nahyan, decorreu num ambiente de grande cordialidade e abertura à intensificação das relações entre os dois países nos mais variados domínios.
Foi abordada a cooperação bilateral em áreas como a saúde, a cultura, a educação e a ciência, as energias renováveis, a economia, as tecnologias de informação e comunicação e o turismo, assim como a possibilidade de desenvolvimento de parcerias empresariais, tendo em vista os mercados africanos e da América Latina.
O diálogo político versou em especial sobre a insegurança na região do Médio Oriente e no Norte de África, tendo presente a importância dos países do Golfo Pérsico no equilíbrio geoestratégico daquela parte do mundo.
A situação na Líbia, Egito, Síria e Iraque, o impasse no processo de paz israelo-palestiniano e a ameaça do grupo extremista auto denominado “Estado Islâmico do Iraque e do Levante” são matéria de grande preocupação nos países do Golfo, tal como nos países da União Europeia.
Havia, assim, todo o interesse em auscultar a opinião e conhecer a análise das ameaças terroristas por parte das autoridades dos Emirados, país que integra o Conselho de Cooperação do Golfo e participa ativamente na coligação internacional de combate ao chamado “Estado Islâmico”.
O Ministro da Defesa Nacional juntou-se à comitiva no Dubai, tendo participado na reunião com o Emir, Xeque Mohammed bin Rashid al Maktoum, Vice-Presidente e Primeiro-Ministro dos Emirados Árabes Unidos e Ministro da Defesa do Dubai e assinado uma carta de intenções sobre cooperação entre os dois países na área da defesa.
Sendo os Emirados um país produtor de petróleo e de gás, com elevado poder de compra, forte crescimento do produto e abundantes recursos financeiros, a visita não podia deixar de ter um pendor vincadamente económico.
Portugal deve estar presente em todos os países onde existem potencialidades de aumento das nossas exportações e de captação de investimento.
Nesse sentido, para além da reunião com o Príncipe Herdeiro, foi muito útil o encontro que mantive com o Presidente executivo de um dos maiores fundos soberanos de Abu Dhabi e Presidente da companhia de aviação Etihad. Foram igualmente frutuosos os encontros de trabalho, em Abu Dhabi e no Dubai, que reuniram empresários portugueses e empresários e representantes dos fundos soberanos dos Emirados.
Foram oportunidades que aproveitei para dar a conhecer melhor Portugal: a situação económica e financeira e as potencialidades do País, as reformas estruturais levadas a cabo, a qualidade dos recursos humanos e das infraestruturas físicas e tecnológicas, a aposta na inovação, o ambiente empresarial, a hospitalidade do povo, as qualidades turísticas, as relações privilegiadas com a África e a América Latina.
Os empresários portugueses e dos Emirados foram convidados a intervir e a apresentar os seus projetos de negócios, o que contribuiu para criar um ambiente favorável a contactos posteriores.
As relações comerciais e de investimento entre os dois países estavam aquém do seu potencial e uma das razões residia no conhecimento insuficiente de Portugal por parte das autoridades e empresários dos Emirados. E há países, como é o caso dos Emirados Árabes Unidos, em que a correção rápida desta situação aconselhava uma intervenção ao mais alto nível político.
No Dubai, no 154º andar de Burj Khalifa, a torre mais alta do mundo, foram-me apresentados projetos imobiliários e de obras públicas de grande dimensão a realizar nos próximos anos, a que se juntam as obras da Exposição Mundial 2020. São oportunidades que se apresentam aos empresários portugueses do setor.
A visita teve um programa intenso, e parti dos Emirados Árabes Unidos com a convicção de que ficara aberto um bom caminho para o fortalecimento das relações políticas, económicas e empresariais entre os dois países.
XXIV Cimeira Ibero-Americana
Acompanhado pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros participei, em dezembro de 2014, na XXIV Cimeira Ibero-Americana, que teve lugar no México, na cidade de Vera Cruz.
Dos presentes, era o único Chefe de Estado que tinha participado, em 1991, então como PM, na cimeira fundadora da Comunidade Ibero-Americana, também no México, em Guadalajara. O Presidente Enrique Peña Nieto fez questão de recordá-lo no início dos trabalhos.
A presidência mexicana escolheu para tema da cimeira “Educação, Cultura e Inovação”, vetores de cooperação ibero-americana da maior importância não só para os 19 países latino-americanos que integram a comunidade mas também para Portugal e Espanha.
Decidi centrar a minha intervenção na economia do conhecimento e sublinhar o impacto decisivo da educação no progresso económico, através do desenvolvimento de competências que estimulam a produtividade, a inovação e a competitividade; sublinhei ainda o papel crucial da educação no combate à pobreza e às desigualdades sociais e na promoção da coesão social.
No debate informal que teve lugar sobre inclusão e desenvolvimento dos jovens, abordei a questão da transição dos jovens do sistema de ensino para o mercado de trabalho e da importância das políticas ativas de combate ao abandono escolar precoce e ao insucesso escolar, dando como exemplo o trabalho realizado nestas áreas em Portugal pela associação Empresários para a Inclusão Social.
A Cimeira de Vera Cruz foi marcada pela aprovação de alguns pontos considerados particularmente importantes por Portugal, como foi o caso da implementação do processo de renovação da Conferência Ibero-Americana iniciado em Cádis, em 2012, (incluindo uma repartição mais equitativa de quotas entre a Península Ibérica e a América Latina), da criação de mecanismos facilitadores do reconhecimento recíproco de diplomas, de títulos e graus académicos e de um programa de mobilidade de estudantes, professores e investigadores entre instituições de ensino.
Portugal não pode deixar de participar na Cimeira Ibero-Americana ao mais alto nível político, dada a estratégia nacional de fortalecimento das relações com a América Latina – e, em particular, do relacionamento especial que temos com o Brasil –, região à qual nos ligam afinidades culturais e linguísticas e interesses económicos.
Para além da participação no debate dos temas da Cimeira, a presença portuguesa sinaliza a prioridade que a nossa política externa atribui ao reforço das relações com os países da América Latina e permite extensos contactos com os respetivos líderes políticos, tendo em vista o aprofundamento da cooperação bilateral.
Nos últimos anos, temos apostado na abertura de mercados e oportunidades de investimento, principalmente nos países da Aliança do Pacífico – Chile, Peru, Colômbia e México – cujas economias revelam apreciável dinamismo e grandes potencialidades.
Portugal é visto com grande simpatia pelos países da América Latina e é reconhecido como um parceiro importante não só para o desenvolvimento das relações bilaterais, mas também para o relacionamento com outras regiões, designadamente a Europa e a África.
Como tenho feito na generalidade das minhas visitas ao estrangeiro, encontrei-me com a comunidade portuguesa na Cidade do México. Foi também o caso nas visitas a Pequim, Xangai, Macau, Coreia do Sul, Emirados Árabes Unidos e Moçambique a que atrás me referi.
Em todos os encontros constatei a mudança na composição das comunidades da diáspora, no sentido de maior qualificação e acrescida influência nos países de acolhimento, assim como a sua abertura para contribuir para o desenvolvimento económico e social de Portugal.
Aníbal Cavaco Silva
Março 2015