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Associativismo e Inovação Social

último post: 18:02 29OUT2008
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A mutação social do Associativismo Estudantil
O associativismo mudou. Esta “frase feita”, tantas e tantas vezes usada como chavão, por todos aqueles que promovem e promoveram o associativismo estudantil e juvenil, é ao mesmo tempo clara e nebulosa. Clara porque retrata de forma simples e inequívoca que as mudanças da sociedade chegaram à forma como se faz associativismo e como os jovens se agrupam e olham o que os rodeia. Nebulosa porque, de pessoa para pessoa, ou, de momento para momento, poderemos estar a dar-lhe significados completamente dispares e mesmo antagónicos. Vou, pois, dar uma ideia do que, para mim, mudou e como mudou, centrando-me no associativismo estudantil, por manifesto desconhecimento das restantes realidades.

As mudanças na sociedade desde a democracia e, em particular, desde a entrada na União Europeia vieram transformar a forma como as pessoas e jovens se organizam. Ao mesmo tempo, a proliferação de Instituições do Ensino Superior veio fazer com que haja muitas realidades distintas dentro da mesma “classe” de dirigente associativo e de estudante do ensino superior. Note-se que, nos anos 80, as listas candidatas à Associação Académica de Coimbra (AAC) eram partidárias, com referências feitas às vitórias e derrotas nos Plenários da Assembleia da República. Convido todos os que lerem este depoimento a consultarem os arquivos da Assembleia da República e lerem as referências às eleições da AAC feitas por deputados de vários partidos. Hoje, a fuga da partidarização, como se tal fosse mau ou incorrecto em democracia, é veloz e qualquer tentativa de colagem a uma organização partidária é tida como negativa. Mas concentremo-nos no essencial. A nebulosidade que, muitas vezes, é vertida do discurso eleitoral e o descrédito que alastra da classe política para os dirigentes associativos faz com que ser um dirigente associativo seja visto como algo não muito positivo pelos pares. Este motivo é causador de um certo esvaziamento de quadros que existe nas Associações. Mas não é o principal.

O processo de Bolonha, a necessidade de acabar mais cedo e rápido os cursos para ir para o mercado de trabalho, o aumento dos custos de frequência do ensino superior são todos motivos para o distanciamento entre os jovens e o associativismo. Não posso esquecer-me de outros três aspectos: primeiro que tudo, a falta de consequências da actuação associativa motivada pelo cada vez maior distanciamento do poder político para com os jovens estudantes e as suas posições – paradoxalmente, tal coincide com o aumento da preparação e formação dos dirigentes e com a mudança da “luta de rua” para a “luta de gabinete”; em segundo lugar, o aumento do número de Instituições e a consequente diminuição da massa crítica presente em cada uma delas; terceiro, a escolha das instituições é, hoje, feita com base na proximidade geográfica e muitos estudantes vão a casa todos os fins-de-semana esvaziando os momentos mais fortes para a produção cultural, desportiva e associativa.

Sou de Coimbra, nasci em Coimbra e estudei em Coimbra. É, pois, esta a realidade que melhor conheço e com a qual convivo desde a infância. Mais do que isso foi esta a realidade que outros viveram antes de mim e cujas histórias guiam o idealismo estudantil em que gosto de acreditar. Contam-se as intermináveis tertúlias na Praça da República e nos Jardins da AAC, as actuações do Teatro Académico e suas digressões, entre muitos, muitos exemplos. Hoje, a semana “associativa estudantil” termina à quinta-feira, porque sexta-feira é dia de ir para casa, tornando difícil a manutenção de grupos de música e teatro ou equipas desportivas com jogos semanais. Falo de Coimbra mas atrevo-me a extrapolar esta realidade para fora da minha cidade, nomeadamente para os centros urbanos médios de Portugal.

Feito o diagnóstico, como mudar? Mais do que exames repetidos e com resultados por todos conhecidos é na procura de soluções que nos devemos concentrar durante este mês de “diálogo digital”. Claramente, os custos de frequência do ensino superior estão à cabeça dos problemas, pois um jovem e a sua família precisam de racionalizar gastos e, portanto, distracções no percurso escolar são pouco toleráveis. O Processo de Bolonha abre a porta ao reconhecimento das actividades extra-curriculares como actividades creditáveis com ECTS e como parte integrante do Suplemento ao Diploma. Levantar os entraves que as instituições colocam ao reconhecimento de actividades não-formais e a obrigatoriedade da entrega do Suplemento ao Diploma, legislado mas longe de estar cumprido, são passos importantes.

Penso que é um caminho mas não chega. Por um lado, é preciso que haja mais apoio e reconhecimento do Estado e das Instituições – faltas justificadas, adiamento de entregas de trabalhos, flexibilidade dos horários de atendimento, entre outras hipóteses. Por outro lado, o reconhecimento das suas posições e actividades é essencial para que haja um feedback positivo do trabalho efectuado. É desmoralizante para toda a gente ver o seu trabalho descredibilizado ou não reconhecido pelas instâncias competentes. Sabemos que a democracia e o poder político divergem no discurso e na acção política, mas o mesmo é, dificilmente, compreensível dentro das instituições de ensino superior onde há diariamente problemas inultrapassáveis para conseguir pequenas coisas, como as enunciadas anteriormente.

Veja-se, como exemplo, que, na AAC, um atleta de uma secção não tem direito a um estatuto de “dirigente associativo” ou de atleta – sim, o atleta que treina diariamente ou duas vezes ao dia em algumas modalidades – mas os dirigentes das secções têm esse estatuto. Ou seja, premeia-se o dirigismo em detrimento dos praticantes de base, em detrimento de todos aqueles que dia-a-dia praticam desporto ou cultura, que se esforçam sem nada receber e que promovem o desporto e a cultura amadora em Portugal. Não se critica o apoio concedido aos dirigentes mas sim a falta de tacto no tratamento destas questões. Maior perplexidade ainda quando se fala de estudantes a praticar desporto universitário e que sentem enormes dificuldades em representar a sua instituição pois precisam de faltar a aulas ou de adiar trabalhos ou provas de avaliação.

Para debater ficam as questões dos melhores apoios a conceder. Não falo em apoios monetários nem materiais. Falo de facilitar a vida a todos aqueles que produzem algo para a sociedade, que dão de si sem nada receber em troca, que entendem o amor à camisola como algo nobre e insubstituível. Procurei distinguir o que é necessário para os dirigentes e para todos aqueles que participam enquanto actores no associativismo e que são a alma e a essência da sua existência. Só faz sentido falarmos dos direitos e deveres dos dirigentes se houver real vontade de todos os jovens fazerem actividades lúdicas extracurriculares, com enriquecimento pessoal inegável e com uma mais-valia na sua formação humana e cívica impar. Aos decisores pede-se que tornem consequente o discurso político e que se passe dos discursos à prática pontapeando a inércia que teima em subsistir.
07OUT2008
16:47
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