Este ano, Lisboa acolhe Portugal no mês de junho, o mês da cidade em festa. Recebe-nos a todos, por ocasião do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.
Tendo ao longo da vida conhecido muitas cidades, é com orgulho e afeto que saúdo, neste dia, a capital que há 55 anos me acolheu, como estudante vindo dos Algarves.
Privilegiada pela geografia, localizada onde a terra acaba e o mar começa, do cais de Lisboa contemplaram-se muitas partidas. No sal de todos os mares do mundo foram derramadas lágrimas de Portugal. Mas as comunidades fortes sabem conviver com tempos menos favoráveis. E essas comunidades são tanto mais fortes quanto melhor conseguem tornar as incertezas do presente em esperanças de futuro.
Os arraiais e as marchas dos bairros antigos de Lisboa animam esta cidade há várias décadas. Desta vontade de celebrar a vida nasceram associações e coletividades, grupos que unem lisboetas de todas as idades, malhas do tecido coletivo que sedimentam laços e fomentam o espírito solidário.
Também as autarquias de Lisboa devem ser saudadas, pelo trabalho que têm feito em prol dos seus moradores e porque a todo o País deram um exemplo, ao tomarem a iniciativa de se reorganizar para melhor servir os cidadãos.
Agradeço à Câmara Municipal de Lisboa, na pessoa do seu Presidente, a hospitalidade com que acolhe estas comemorações e a colaboração prestada, neste ano de 2012, à celebração do Dia de Portugal.
Esta é a cidade da luz suave que fascina os poetas e seduz os viajantes que a visitam pela primeira vez. Entre os múltiplos cambiantes da claridade, a luz inesquecível de Lisboa surpreende pelos seus contrastes. Cosmopolita e aldeã, tradicional e vanguardista, Lisboa é, ao mesmo tempo, uma urbe antiga e uma cidade jovem, uma cidade que deve atrair os jovens e dar-lhes condições para aqui se fixarem. Burgo de comércio, é também capital de serviços. Cidade onde se cultivam hortas, Lisboa é igualmente espaço de turismo e lazer.
Estes contrastes encontram a sua origem naquele dia distante em que os abalos da Terra fulminaram a cidade antiga. Às ruelas estreitas e escuras sucederam-se as linhas retas, planificadas pelo iluminismo. Na Baixa de Lisboa, os espaços abriram-se à luz. A cidade renasceu das cinzas fazendo-se outra, bem diferente da anterior. Mas nesse contraste entre o antigo e o novo houve algo que permaneceu intocado: o espírito de Lisboa. Os lisboetas, nesses dias de ansiedade e pânico, não baixaram os braços. Com ânimo e com esperança, reconstruíram a sua capital, tornando-a ainda mais bela.
Séculos depois, aproveitando uma oportunidade única para erguer cidade, devolveu-se aos lisboetas um trecho do imenso rio. Na parte oriental de Lisboa, edificou-se o Parque das Nações, marca contemporânea da abertura de Portugal ao mundo, que, no extremo ocidental da cidade, tem o seu contraponto no Centro Cultural de Belém.
Lisboa é uma cidade de encontros, na confluência de povos e culturas. Iremos vê-lo ainda hoje, ao visitarmos o Bairro da Mouraria. Aí, sem sairmos de Portugal, viajaremos pelo mundo inteiro, encontrando gentes de várias origens, pessoas e famílias que fazem de Lisboa um mosaico cultural riquíssimo e um exemplo de tolerância. Na Mouraria estaremos também com o Fado, que da Humanidade inteira é património.
Sob estas arcadas do Terreiro do Paço, nesta praça impregnada de tantas memórias, é-nos permitido evocar outros encontros, diálogos que se travaram ao longo dos séculos entre vultos cimeiros da nossa História e da nossa Cultura. Pelas ruas de Lisboa antiga ecoam ainda os passos do jovem Fernando de Bulhões, futuro Santo António. Das igrejas feitas de ouro e azulejo transborda a oratória barroca de António Vieira e o encantamento do seu verbo. Na Baixa de Lisboa pressente-se ainda o desassossego do génio de Pessoa:
“Outra vez te revejo – Lisboa e Tejo e tudo...”
É o Tejo que dá a Lisboa a sua configuração singular. Do Cais das Colunas, contemplamos o rio majestoso que se abre ao Atlântico num estuário de extraordinária beleza. Avistamos o Castelo, que nos observa sobre o casario da Cidade Branca.
Todas as grandes cidades têm uma ideia de si. Buscam a sua essência. Alimentam e divulgam o espírito que as faz únicas.
A essência de Lisboa deve estar numa cultura fiel às suas origens, que fomente a inovação na ciência, o empreendedorismo na economia, a profundidade na vida espiritual, a excelência no ensino.
Nos nossos dias, uma cidade tem de fazer escolhas, selecionando o que é prioritário para a sua afirmação no confronto com outros espaços urbanos e definindo o que é essencial para a preservação da qualidade de vida dos seus habitantes.
Há que escolher onde investir, financeira e politicamente. Definida uma estratégia, encontrado um rumo, é fundamental que a ação dos poderes públicos seja acompanhada de um incremento da mobilização cívica dos cidadãos. Não tenhamos dúvidas: sem a participação ativa dos lisboetas, sem o envolvimento permanente dos seus moradores, os autarcas desta cidade não poderão construir uma capital de futuro que respeite e defenda a herança do passado.
Dos lisboetas reclama-se um maior cuidado na proteção da sua cidade. Uma atitude ativa na preservação do espaço público e dos equipamentos coletivos, maior civismo na segurança e na limpeza das ruas, um empenhamento esclarecido na salvaguarda do património histórico e arquitetónico. Sem o contributo e o brio dos lisboetas, Lisboa não cumprirá o seu desígnio de grande capital europeia.
Lisboa tem uma vocação. É cidade do Mundo. É capital antiga, urbe de muitos séculos. Não existe uma capital da Europa que consiga reunir tantas qualidades distintas: a proximidade ao oceano e às praias, na Linha do Estoril ou na outra margem do Tejo, um rio imenso banhado por uma luminosidade ímpar, marcas de História que se desvendam em cada esquina. Lisboa faz-se no subir e descer de sete colinas que fornecem panoramas únicos e pontos de vista deslumbrantes.
Outras cidades poderão ser imponentes nas suas edificações e opulentas nos acervos dos seus museus, mas nenhuma oferece, como Lisboa, condições para o desenvolvimento de três dimensões essenciais da vida humana: o trabalho, o lazer e a cultura. Que cidades do mundo possuem uma linha de costa como Lisboa e, ao mesmo tempo, um património tão rico e diversificado? Em que capitais poderão os seus habitantes ou visitantes fruir a proximidade ao mar e a presença de uma História de tantos séculos? Onde encontramos um convívio tão harmonioso entre passado e presente, entre culturas e povos de tantas partes do mundo?
Lisboa beneficia ainda da circunstância de ser, em simultâneo, um eixo de várias centralidades e uma periferia que serve de ponte ao diálogo com o Atlântico. Cidade ágil e aberta, o seu destino é transformar a periferia em centralidade, juntando aquilo que o mar divide.
Cidade de imensas potencialidades, Lisboa tem de inverter a lógica do despovoamento. Muito há a fazer. Acima de tudo, temos de olhar o futuro.
O mesmo diriam, quem sabe, os corvos de São Vicente, padroeiro desta cidade. Na simbologia medieval, assegurava-se que o corvo, quando crocita, quer sempre dizer: Amanhã! Amanhã!
Assim é, de facto. O amanhã é o que conta, sendo certo que o amanhã constrói-se hoje e agora. O futuro será o que os lisboetas dele fizerem. Estou certo de que Lisboa, cidade da luz suave, trará a luz da esperança ao destino de Portugal inteiro.
No Dia de Portugal, Lisboa em festa celebra o presente que somos, comemora o passado que fomos e ilumina o futuro que queremos ser. Junto ao rio, cais da esperança, Lisboa anuncia um País melhor e mais justo.
Obrigado.
http://www.presidencia.pt/diadeportugal2012/?idc=588&idi=66411