Discurso do Presidente da República na X Conferência de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa: Bloco C – DEBATE POLÍTICO sobre “A CPLP e a Globalização”
Díli, Timor-Leste, 23 de julho de 2014

Quero começar por expressar o meu apreço pelo trabalho desenvolvido pela presidência moçambicana da CPLP, que agora cessa. Senhor Presidente Armando Guebuza, meu caro Amigo, o empenho de Moçambique e, em especial, o de Vossa Excelência, durante os últimos dois anos, merecem o meu profundo reconhecimento.

Ao nosso anfitrião, Senhor Presidente Taur Matan Ruak, caro Amigo, quero agradecer a calorosa hospitalidade e a amizade muito fraternal com que nos tem recebido nesta cidade de Díli. Quero ainda endereçar-lhe as minhas felicitações pelo profissionalismo e rigor na organização desta Conferência de Chefes de Estado e de Governo. Gostaria igualmente de reiterar a Vossa Excelência os meus votos de sucesso para a Presidência que agora é chamado a assumir.

A importância que atribuo a estes encontros motivou-me sempre a marcar presença. Esta é, para mim, a quinta cimeira.

Em todas senti, como hoje volto a constatar, que existe entre nós um verdadeiro espírito fraternal e uma natural proximidade. Como qualquer outra comunidade, partilhamos traços identitários, mas também um código de princípios orientadores. Verdadeiramente especial é a opção inequívoca, hoje como há 18 anos, pela construção de um projeto comum de futuro, dando corpo ao sentimento e à vontade dos nossos povos.

O tema em debate – “A CPLP e a Globalização” – convoca-nos para uma reflexão, diria que quase genética, da nossa Comunidade. A apresentação de respostas para os novos desafios globais passa, necessariamente, pelo conhecimento daquilo que, intrinsecamente, nos caracteriza e distingue.

Senhores Chefes de Estado e de Governo,

Somos uma organização global. A nossa Comunidade é composta por Estados que se estendem a quatro continentes, o que não tem diminuído a nossa capacidade de entendimento, de cooperação estreita, de trabalho conjunto e de apoio mútuo.

A CPLP assume-se, de forma crescente, como uma entidade de referência no mundo atual. A síntese que tem sido capaz de criar, nas mais diversas questões internacionais, não obstante as diferentes sensibilidades nacionais e regionais presentes na organização, encontra-se na base deste reconhecimento.

Os níveis de compreensão existentes entre os nossos países, a concertação político-diplomática e a cooperação ampla e multifacetada são pilares fundamentais da nossa Comunidade e chaves para um futuro de maior relevo a nível internacional.

A valorização da CPLP, enquanto ator internacional, reforça a posição de cada um dos nossos países nos diversos palcos em que estamos representados. É, por isso, nosso dever apostar numa articulação cada vez mais intensa e abrangente, alargada aos mais diversos níveis, em complementaridade com as organizações internacionais a que pertencemos e onde nos cabe procurar inserir a “visão CPLP” sobre os assuntos de maior interesse para os nossos Estados.

Os recentes desenvolvimentos na Guiné-Bissau demonstraram como a posição solidária, coerente e fiel aos princípios basilares da nossa Comunidade contribuiu decisivamente para a reposição da legitimidade e da ordem constitucional. O papel da CPLP e o de cada Estado-Membro, das Nações Unidas, da União Africana e da União Europeia foram determinantes para a atual conjuntura de esperança na Guiné-Bissau.

Quero saudar o Senhor Presidente José Mário Vaz, que tive o privilégio de receber em Portugal ainda como Presidente eleito. Senhor Presidente, é com muita satisfação que acolhemos o regresso pleno da Guiné-Bissau aos trabalhos da CPLP. Reitero, pela minha parte, a disponibilidade de Portugal para continuar a apoiar os esforços de paz e de desenvolvimento na Guiné-Bissau.

Importa também sublinhar o interesse crescente de novos Estados, também eles de continentes diversos, em se tornarem Observadores Associados da CPLP. As candidaturas da Geórgia, da Namíbia, da Turquia e do Japão abrem novas oportunidades de cooperação e de projeção da CPLP no mundo.

Por outro lado, o aumento do número de Observadores Consultivos é uma importante forma de estender o alcance da CPLP à sociedade civil.

Senhores Chefes de Estado e de Governo,

A cooperação no seio da CPLP estende-se hoje às mais diversas matérias e envolve um número cada vez maior de sectores das nossas sociedades. Os seus resultados são cada vez mais visíveis.

Ao refletir sobre o papel futuro da CPLP num contexto de globalização, importa sublinhar a necessidade de um compromisso político mais forte e dinâmico. O quadro teórico e institucional já existe. Tem inclusivamente vindo a ser aperfeiçoado. Porém, é fundamental que se prossigam esforços políticos no sentido de uma implementação efetiva do nosso projeto comum, que tenha reflexos visíveis no quotidiano dos nossos povos.

É nossa obrigação promover políticas que incentivem uma maior proximidade entre as nossas sociedades e economias. O desafio é complexo. Bem sabemos que a pertença a diversos espaços regionais impõe constrangimentos nesta linha de ação. Porém, no âmbito dos nossos quadros normativos, muito já tem sido feito e a margem para progressão é encorajadora.

Poderá ser impulsionado o estabelecimento de uma cooperação mais informal e abrangente, como, por exemplo, ao nível da cooperação universitária e científica, do desenvolvimento de redes de conhecimento, do intercâmbio entre estudantes, escritores e artistas, dos contactos empresariais ou de redes das diásporas dos países da CPLP.

Como já tive ocasião de referir, a CPLP tem de se abrir mais ao contributo dos seus cidadãos, designadamente aos mais jovens, para que estes a sintam como algo que lhes pertence e que traz uma real mais-valia às suas vidas.

Caros Amigos,

Neste projeto de futuro, a língua portuguesa desempenha um papel primordial. Foi um dos primeiros fatores de aproximação e é um dos traços que nos identifica e distingue. A língua portuguesa enquanto ativo estratégico é uma opção política da CPLP. Neste contexto, língua e culturas devem ser encaradas como eixos que se reforçam mutuamente. O facto de a língua portuguesa incorporar pluralidades, que lhe advêm da abertura e da partilha a diferentes países e culturas, reveste-a de um valor intrínseco acrescido. É já inegável o seu valor cultural, económico, geopolítico e científico.

A escolha do tema “A Língua Portuguesa: Património Comum, Futuro Global” para a Cimeira da CPLP de Lisboa, aquando da Presidência portuguesa, procurou lançar a reflexão sobre a importância da língua para a CPLP no contexto da globalização. Nessa altura, foi sublinhada a importância da concertação de esforços e da estratégia na prossecução de políticas que projetassem e afirmassem a Língua Portuguesa internacionalmente. Foi preparado o caminho o Plano de Ação de Brasília e, mais recentemente, do Plano de Ação de Lisboa, que aqui deveremos adotar.

A língua portuguesa tem hoje legítimas pretensões globais. O português é hoje língua oficial de várias organizações internacionais. A escala global do português é ainda projetada pelas diásporas dos países de língua oficial portuguesa e pelo interesse que a sua aprendizagem enquanto língua estrangeira tem suscitado por todo o mundo, tornando-o hoje um dos idiomas em maior expansão. Este interesse revela bem a importância de valorizarmos a língua como uma vantagem competitiva.

O Plano de Ação de Lisboa definiu dois grandes objetivos de futuro: a língua portuguesa no reforço do empreendedorismo e da economia criativa; e a língua portuguesa no desenvolvimento científico e na inovação.

A aposta na implementação efetiva das orientações emanadas das Cimeiras e do Plano de Ação de Lisboa deve ser forte e inequívoca. A internacionalização da língua portuguesa é um dos traços da maturidade da CPLP.

Senhores Chefes de Estado e de Governo,

O potencial de atração da nossa Comunidade e o reconhecimento internacional da CPLP assentam no conjunto de valores identitários que partilhamos, como são a língua portuguesa e os princípios fundadores de defesa da Paz, do Estado de Direito democrático, dos Direitos Humanos e do desenvolvimento económico-social.

É por isso fundamental que continuemos a deixar claro, no presente e no futuro, que são esses os valores que determinarão as nossas decisões e as nossas iniciativas.

Olhando para os 18 anos de viagem, não posso deixar de sentir orgulho naquilo que soubemos edificar, de forma sólida e convicta. A aposta na CPLP é, mais do que nunca, um investimento de futuro. Dispõe de muito potencial ainda por explorar, mas tem provas dadas de que o saberá fazer.

A familiaridade que nos aproxima e a nossa ética comum são as principais forças impulsionadoras da nossa união. A nossa atuação fora do contexto CPLP, sendo regida por um quadro de referências comuns, tende a projetar a nossa Comunidade.

Portugal é hoje, no contexto da União Europeia, uma voz de peso em qualquer matéria relacionada com os países da CPLP. Esta posição junto dos nossos parceiros europeus foi fruto das posições portuguesas consistentemente ligadas à definição da CPLP como um eixo central da nossa política externa.

A CPLP é já uma prioridade nas políticas externas dos nossos oito Países, mas o reforço da sua credibilidade exige-nos um compromisso acrescido de “ser CPLP”, de forma proactiva, nos palcos bilaterais e multilaterais em que cada um de nós atua.

Timor-Leste constituiu um exemplo eloquente do nosso projeto comum. A construção e consolidação do Estado de direito democrático em Timor-Leste constituiu um caso de sucesso e de referência. O estabelecimento de raiz de instituições democráticas em Timor-Leste muito deve à cooperação e à solidariedade no seio da CPLP, como a CPLP muito deve ao sucesso da democracia timorense.

A presidência timorense que agora se inicia é fonte de esperança para uma projeção renovada da capacidade de atuação e de influência da nossa Comunidade.

Meus Caros Amigos,

O papel da CPLP na globalização e o seu trajeto de futuro passam pela ambição de concretizar plenamente os princípios fundamentais da CPLP. Estes assumem-se como a bússola de uma navegação cada vez mais exigente. O nosso barco já provou ser sólido e os nossos marinheiros audazes.

Sendo a minha última Cimeira, quero terminar a minha intervenção agradecendo a amizade, a disponibilidade e a excelente cooperação de todos. A nossa pertença a um espaço que supera a geografia para se assumir como uma forma de estar, de sentir e de atuar exige que criemos as condições para uma ação cada vez mais sólida e expedita. Nisto me empenhei enquanto Primeiro-Ministro e Presidente da República e, sempre, enquanto cidadão da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.

Muito obrigado.