A Representação da República nas Regiões Autónomas é o corolário lógico do modo como o legislador constitucional concebeu e desenhou o edifício dos poderes do Estado, consagrando a existência de autonomias regionais no quadro de um Estado uno.
De facto, a Constituição de 1976, cujo 35º aniversário celebramos, definiu, desde os seus alvores, o Estado português como um Estado unitário parcialmente regionalizado.
Nesse contexto, a consagração das autonomias insulares, uma das mais frutuosas realizações do texto constitucional de 1976, implica a necessidade de conciliação entre o carácter unitário do Estado soberano, por um lado, e o reconhecimento das especificidades das regiões dos Açores e da Madeira, por outro.
Esta conciliação entre unidade do Estado e diversidade autonómica tem sido realizada, ao longo das últimas décadas, através da prática política e constitucional, seja por via da manifestação das pretensões de maior autonomia por parte das regiões, seja através das sucessivas revisões da Lei Fundamental, seja, enfim, por meio da jurisprudência do Tribunal Constitucional.
Se este processo foi, por vezes, marcado por tensões e atritos, o saldo global destes 35 anos de regime autonómico afigura-se extremamente positivo. A autonomia das regiões insulares é, nos nossos dias, um elemento consolidado do regime democrático português, que ninguém questiona. As autonomias regionais provaram, e provaram bem, que não só correspondem a uma histórica aspiração das populações insulares como são o instrumento mais adequado para satisfazer os interesses legítimos dessas populações.
O saldo global das autonomias afere-se pela clara melhoria do bem-estar e da qualidade de vida dos açorianos e dos madeirenses, e pelos níveis de desenvolvimento e progresso aí registados. Mas o balanço positivo decorre primordialmente da vontade do povo. São as populações dos Açores e Madeira que, revendo-se no modelo de autonomia e mantendo intacto o patriotismo da portugalidade, mostram que a conciliação entre unidade e diversidade do Estado não suscita controvérsia e é uma fórmula pacífica da vida pública nacional.
A figura dos Representantes da República inscreve-se nesta lógica. Onde existe reconhecimento de autonomia político-administrativa e de poder legislativo próprio deve existir uma representação da República. Caso contrário, estariam os poderes autonómicos isentos dos limites e do controlo que impendem sobre a actividade dos órgãos de soberania com competências para legislar, a Assembleia da República e o Governo. À competência para legislar tem de estar associada a faculdade de controlo dos actos normativos, desde logo no plano da sua conformidade com a Constituição da República.
A par desta tarefa de controlo dos actos normativos, outras se encontram associadas à função de representação da República. Trata-se, na verdade, de uma das mais relevantes funções do Estado, que exige sentido de dever público, prudência e moderação, conhecimento das realidades insulares – dos Açores e da Madeira, tão diferentes entre si - e, acima de tudo, a percepção clara da necessidade de assegurar a coesão nacional no respeito pela autonomia própria dos poderes regionais.
Não por acaso, a Constituição atribui ao Presidente da República, ouvido o Governo, a competência para designar os Representantes da República. Em cada uma das Regiões Autónomas, eles são os mais altos magistrados, que por direito próprio, consagrado na Lei Fundamental, representam o todo da República no que esta tem de soberana, una, indivisível. Como já tive ocasião de afirmar publicamente, a lealdade em relação aos Representantes da República é também lealdade em relação a quem os designou.
Saúdo, calorosamente, os Senhores Representantes para as Regiões Autónomas que acabam de tomar posse. O perfil pessoal e a trajectória profissional de ambos demonstram, de forma inequívoca, que dispõem dos requisitos de experiência, conhecimento e estatura moral para representarem condignamente a República Portuguesa nos Açores e na Madeira.
Nesta ocasião, quero também deixar uma palavra de apreço aos Senhores Conselheiros Antero Alves Monteiro Diniz e José António Mesquita pela forma empenhada e leal como exerceram as suas funções.
Aos novos titulares do cargo, Senhor Representante da República Pedro Catarino e Senhor Representante da República Ireneu Cabral Barreto, desejo as maiores felicidades, a que associo a garantia de que contarão sempre com o meu apoio para o exercício de funções difíceis, sem dúvida, mas essenciais para o reforço dos laços de solidariedade entre os Portugueses.
O momento que atravessamos é de unidade e de coesão. Vivemos tempos em que os sacrifícios têm de ser repartidos por todos, em que ninguém pode ter a pretensão de se eximir ao contributo necessário para vencermos as adversidades do presente. Em boa medida, sereis vós, Senhores Representantes da República, garantes da coesão nacional nas Regiões Autónomas. Desejo-vos, por isso, os maiores êxitos na exigente missão que agora iniciam.