Intervenção do Presidente da República por ocasião do Jantar de Gala da Exposição “Encompassing the Globe: Portugal and the World in the XVI and XVII Centuries”
Washington, 20 de Junho de 2007

Senhoras e Senhores,

Deixem-me começar por transmitir o prazer que a minha mulher e eu temos em estar aqui hoje, a festejar convosco a inauguração de uma Exposição, que é uma homenagem a uma aventura. Uma aventura ousada e vasta, e também bem planeada. Uma aventura que ligou povos distantes e estabeleceu o cenário do mundo em que hoje vivemos.

“Encompassing the Globe: Portugal and the World in the XVI and XVII Centuries” é uma magnífica Exposição, que põe em destaque o papel de Portugal como pioneiro da globalização moderna. Um país impelido pela determinação de agir, de se abrir a novos povos e a novas culturas. De facto, um país que disseminou conhecimentos em redor do globo através de vários séculos.

Embora proporcionando uma excelente oportunidade para dar a conhecer a nossa História, estou convencido de que esta Exposição também despertará a curiosidade das pessoas sobre o país que somos actualmente e o país que queremos ser no futuro.

Fernando Pessoa, que foi um dos nossos maiores poetas e se encontra entre os grandes nomes da literatura mundial do século XX, escreveu estas linhas:

“E a orla branca foi de ilha em Continente
Clareou, correndo, até ao fim do mundo
E viu-se a terra inteira, de repente
Surgir, redonda, do azul profundo”

Tempos houveram em que eu poderia presumir que compreenderiam o que acabo de dizer. O português era então a língua franca do mundo, usada igualmente por príncipes e mercadores. Embora o português seja actualmente a terceira língua europeia do mundo, falada por quase 250 milhões de pessoas, a língua franca actual é a vossa. E em inglês, numa tradução livre, o Poema de Pessoa diria o seguinte:

“And the white fringe from isle to continent was lit up,
Running on and on until the world’s end,
And suddenly earth was seen whole,
Arising, round, from the deep blue”

Dificilmente encontraria uma forma melhor de descrever o espírito desta Exposição, que evoca a grandeza de um período da nossa História movido pela vontade e pelas convicções que nos obrigaram a partir do nosso território em direcção ao desconhecido, atrevendo-nos a navegar pela primeira vez o Atlântico, este grande Mar cujas costas partilhamos – Portugal e os Estados Unidos.

Monstros como o Adamastor, que supostamente assomava a costa sul de África, deram lugar ao Cabo da Boa Esperança, assim baptizado por Bartolomeu Dias. O encontro que eventualmente se seguiu deu origem a uma grande herança que se encontra dispersa por todo o mundo.

Em Roma, num acto que soaria hoje completamente absurdo, o Papa abençoou o Tratado de Tordesilhas, nos termos do qual as grandes potências do momento, Portugal e Espanha, acordaram como dividiriam o mundo. Lisboa, a nossa capital, transformou-se num local agitado, onde as pessoas vinham fazer trocas comerciais e ver coisas nunca antes vistas, nem mesmo imaginadas. O mundo mudou e nunca mais foi o mesmo.

A herança portuguesa dessa época está por todo o mundo, sob a forma de monumentos, de palavras, de hábitos, do sangue que corre em tantas veias. Não só nos locais longínquos onde estivemos, mas também em Portugal, na própria Europa, mudados para sempre em consequência do encontro.

É este o verdadeiro significado de abarcar o mundo – a interacção entre povos e culturas – que esta Exposição tão bem capta. As magníficas peças de arte aqui reunidas contarão parte da história. Para a aprofundar, temo que seja necessário viajarem aos cinco continentes, visto tornar-se difícil transferir para Washington algumas outras peças, como por exemplo os fortes e as catedrais, apesar dos melhores esforços de Julian Raby, de Jay Levenson e de toda a sua equipa.

Senhoras e Senhores,

Para qualquer país, a História deve ser uma fonte de inspiração para o futuro, sob pena de se tornar numa mera história encantadora. Os que vieram antes de nós merecem mais do que isso. E também os que virão depois de nós.
A aventura portuguesa nasceu de sonhos e certamente de ambição. Mas não teria sido possível sem uma preparação cuidadosa. Os conhecimentos e informações técnicas foram meticulosamente recolhidos e utilizados na preparação das novas viagens em volta do globo.

A investigação e desenvolvimento – como hoje os designamos – foi encorajada e activamente apoiada: foram criadas escolas de navegação com mestres e alunos de diferentes países (a evasão da intelectualidade era então menos problemática do que hoje em dia, ao que parece); plantas e animais recém-descobertos foram estudados, novos instrumentos inventados que tornaram mais fácil a navegação e a cartografia cada vez mais rigorosa.

O sonho e a ambição são essenciais, mas nada é possível sem uma preparação cuidadosa e o apoio consistente dos que ousam e inovam.

Portugal deseja estar, uma vez mais, entre os melhores num mundo globalizado e altamente tecnológico. E chegaremos lá! Estamos a desenvolver uma economia que se baseia no conhecimento e na educação, misturando os nossos valores tradicionais com a modernidade e a excelência. Um lindo país para visitar e um local onde investir. Um país com amigos em todo o mundo e portanto um excelente parceiro para abarcar o globo …

Atingimos muito mais do que imaginariam. A gama alargada de actividades que foram organizadas em paralelo a esta Exposição dar-vos-á uma ideia sobre aquilo a que me refiro. Poderá constituir uma surpresa agradável para muitos de vós constatar que inesperadamente já desempenhamos um papel principal nalgumas áreas e segmentos.

Portugal assumirá a Presidência da União Europeia a partir do dia 1 de Julho. As anteriores Presidências Portuguesas constituíram sempre um incentivo à reforma interna e às relações externas europeias, através de melhores ligações transatlânticas e das primeiras Cimeiras da UE com os países do Mercosul, com África e com a Índia.

Desta vez tentaremos ajudar a ultrapassar o impasse institucional, de modo a permitir à UE lidar melhor com os desafios dos nossos tempos, incluindo os da cena internacional.

As relações externas serão mais uma vez um ponto alto da nossa ordem do dia, começando com a primeira Cimeira da UE com o Brasil, uma grande nação e um país de língua portuguesa. Terão também lugar reuniões a um nível igualmente elevado da UE com a China, a Rússia, a Índia, a Ucrânia e espera-se que com África.

Mais uma vez, faremos o nosso melhor no sentido de promover as relações entre a União Europeia e os Estados Unidos, pois consideramos que estas são essenciais para ambos e para um melhor futuro do mundo em geral. A União Europeia em que acreditamos é aberta e auto-confiante, definindo-se com base nos seus próprios méritos e não contra um terceiro. A União Europeia em que acreditamos é um dos parceiros dos Estados Unidos.

Senhoras e Senhores,

Portugal e os Estados Unidos são amigos e aliados há muito tempo. Os Estados Unidos são o nosso principal parceiro comercial fora da União Europeia. Temos uma comunidade portuguesa grande e bem estabelecida neste país. As perspectivas para uma cooperação mais intensa entre os nossos países, empresas e universidades são imensas.

Concluirei agradecendo do fundo do coração a todos os colaboradores da Smithsonian Institution que deram o seu apoio e trabalharam intensamente para organizar esta Exposição, incluindo aqueles que a patrocinaram. Uma palavra especial para Julian Raby e Jay Levenson que, desde o início, acreditaram sinceramente neste projecto. A todos eles, o globo abarcado certamente agradecerá. Começando pelos que sonharam, que ousaram e que fizeram com que tudo acontecesse há muitos séculos: o povo português.

Obrigado