Discurso do Presidente da República na Cerimónia de Apresentação de Cumprimentos de Ano Novo do Corpo Diplomático Acreditado em Portugal
Palácio Nacional de Queluz, 13 de janeiro de 2016

Quero começar por agradecer a vossa presença e endereçar-vos os votos de um Feliz Ano de 2016, extensivos às vossas famílias. Agradeço, igualmente, as simpáticas palavras que Sua Excelência Reverendíssima o Núncio Apostólico me dirigiu em nome do Corpo Diplomático acreditado em Lisboa. Peço que transmitam aos vossos Chefes de Estado os meus sinceros votos de um ano de 2016 com paz e prosperidade.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

Prosseguindo a tradição mantida ao longo dos últimos nove anos, esta será, como sabem, a derradeira ocasião em que, na qualidade de Chefe de Estado, vos saúdo no início de um novo ano e, por vosso intermédio, os países que aqui representam. É um momento a que sempre atribuí grande significado, também pelo apreço muito particular que me merece a atividade diplomática na criação de pontes de diálogo e no reforço das relações entre os povos.

O ano de 2015 constituiu um sério desafio a vários níveis.

A Comunidade Internacional viveu períodos dolorosos na sequência dos diversos atentados terroristas que provocaram elevadas perdas de vidas humanas e visaram valores que nos são muito caros.

A ameaça terrorista não é uma novidade, mas tem vindo a conhecer desenvolvimentos cada vez mais preocupantes. É necessário reforçar os esforços concertados de todos os Estados e organizações internacionais e regionais para um combate firme e determinado, em várias frentes, a todas as formas de terrorismo.

Outro desafio premente é o afluxo massivo de refugiados e migrantes com que a Europa se tem confrontado. A solidariedade e a proteção dos direitos fundamentais devem estar no centro da política migratória da União. Partindo destes princípios, importa cuidar da integração dos migrantes, promover canais legais de migração e assegurar uma política de controlo de fronteiras externas eficaz. Num momento em que parecem despontar tentações securitárias e nacionalistas, é essencial garantir que a liberdade de circulação no espaço europeu não seja posta em causa por propostas isolacionistas e xenófobas.

As vagas de refugiados e o exigente contexto económico e financeiro em que vivemos constituem, pois, testes à nossa solidariedade e ao nosso compromisso para com os valores democráticos. As respostas não podem ser encontradas em muros ou num isolamento autoimposto. É essencial cooperar com os países de origem, trânsito e destino mais afetados pelas questões migratórias, bem como abordar as causas profundas destes fenómenos.

Ainda assim, o ano que findou trouxe-nos, igualmente, sinais positivos. No caso de Portugal, os indicadores económicos registaram uma melhoria gradual. A nossa economia está mais competitiva e os nossos empresários mais empreendedores, conquistando novas quotas de mercado. A eleição de Portugal para o Conselho Executivo da Organização Mundial do Turismo sinaliza bem o nosso dinamismo num setor onde temos alcançado excelentes resultados. Melhorámos os termos da nossa balança comercial e a nossa capacidade de captação de investimento externo.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

Ao longo dos dez anos em que tive a honra de exercer as funções de Presidente da República, realizei 80 deslocações ao estrangeiro e recebi inúmeros dignitários de outros países, em ocasiões de âmbito bilateral e também multilateral, incluindo nas importantes cimeiras internacionais que, neste período, aqui acolhemos.

Permitam-me que sublinhe o facto de, em todas as visitas que realizei, ter feito questão de me encontrar com as Comunidades Portuguesas residentes nos vossos países. Constatei com orgulho o seu dinamismo, a sua boa integração, a vitalidade dos laços que as ligam a Portugal, o seu contributo para a vida económica e cívica dos países onde se encontram.

As Senhoras e os Senhores Embaixadores conhecem bem a solidez e a continuidade das linhas de orientação da nossa ação externa.

O nosso firme compromisso com o multilateralismo é uma das linhas mestras da nossa política externa e norteou uma parte importante das minhas atividades de diplomacia presidencial. Recordo, por exemplo, o biénio 2011-2012, em que Portugal assumiu o seu mandato no Conselho de Segurança das Nações Unidas: foi para mim ponto de honra presidir ao primeiro debate aberto ali organizado por Portugal. Assim como o foi a participação na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2008 e novamente em 2015, data em que assinalámos os 70 anos das NU e os 60 anos da adesão de Portugal àquela organização.

O empenho no multilateralismo assume, aliás, contornos muito concretos, como é o caso da participação de destacamentos das Forças Armadas Portuguesas em diversas operações na Europa, África e Médio Oriente, totalizando neste momento cerca de 500 efetivos, a que se somam meios aéreos e navais.

Os Oceanos foram um dos temas que, desde o início, assinalei como prioridade no exercício das minhas funções. O Mar é, para Portugal, um forte elemento identitário e foi com satisfação que assisti ao reconhecimento da sua importância no plano do desenvolvimento económico e enquanto peça-chave da ação política interna e externa.

Relembro a oportunidade que tivemos, no ano passado, de acolher e organizar a Semana Azul, evento internacional que mobilizou mais de setenta países e instituições internacionais.

O espaço lusófono e a sua expressão multilateral, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, vêm merecendo um interesse crescente da parte de outros parceiros, como pude testemunhar ao longo das cinco Cimeiras da CPLP que se realizaram nos últimos dez anos. É prova do dinamismo de uma Comunidade estrategicamente importante: pela sua dimensão, pela riqueza dos seus recursos e pela firmeza da cooperação que ali se estabelece.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

A 1 de janeiro de 2016, cumpriram-se os 30 anos da adesão de Portugal às Comunidades Europeias. Três décadas de enormes mudanças, e em que participámos ativamente no aprofundamento do projeto europeu.

Alguns dos desafios com que a União Europeia se defrontou no ano passado já se vinham manifestando há algum tempo; outros assumiram nova premência em 2015 e continuarão a requerer a nossa atenção em 2016. Para além das questões dos refugiados e migrantes e do combate ao terrorismo ou da situação na Ucrânia, penso também no crescimento sustentável e na criação de emprego e na descarbonização da economia.

Face a estas e a outras matérias, diria que a unidade em torno dos princípios fundadores é, e será, mais importante do que nunca.

Em 2015, a Europa foi novamente destino de algumas das minhas deslocações. Em Espanha, visitei com S.M. Felipe VI a cidade da Corunha, um momento relevante no contexto da cooperação transfronteiriça entre os nossos dois países. Desloquei-me a Paris, numa viagem que incluiu o meu primeiro encontro com o Presidente Hollande e a primeira visita de um Chefe de Estado português à OCDE.

Realizei uma Visita Oficial à Noruega, que teve um programa intenso e diversificado, com uma forte componente ligada à agenda do mar e efetuei Visitas de Estado à Bulgária e Roménia, reavivando as nossas relações com estes parceiros de Portugal na União Europeia e na NATO. Tive ainda ocasião de participar na reunião do Grupo de Arraiolos que se realizou na Alemanha e no X Encontro da COTEC Europa, que teve lugar em Itália.

Gostaria de fazer referência, ao Centro Norte-Sul do Conselho da Europa. Congratulo-me com o seu renovado dinamismo e com a capacidade de atrair novos Estados Membros. O Centro, pela sua experiência e atualidade dos seus valores tem um papel fundamental na promoção de pontes de diálogo e cooperação que merecem ser valorizadas.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

O eixo transatlântico é outro dos vetores fundamentais da política externa portuguesa. Sempre conferi grande importância às relações bilaterais com os EUA. Coincidimos em preocupações e interesses, e, também aqui, naturalmente, a concertação de esforços é fundamental para a solução de problemas comuns.

No âmbito da Aliança Atlântica, Portugal mantém-se um membro ativo e empenhado. Entre outubro e novembro passados, acolhemos, conjuntamente com outros dois países, o exercício de Alta Visibilidade da NATO Trident Juncture 2015.

Também com a América do Sul Portugal mantém uma relação singular, fundada em laços históricos de amizade e cooperação. Temos afinidades políticas, culturais e económicas, mas também uma ligação afetiva. São países com os quais reforçámos substancialmente o nível de relacionamento ao longo dos últimos anos e com quem estamos apostados em identificar e incrementar as oportunidades de cooperação.

Uma menção especial, nesta área, ao Brasil. Registo, com agrado, uma intensa agenda de visitas bilaterais e espero que seja possível acordar em breve uma data para a realização da XII Cimeira Luso-Brasileira.

O continente americano constituiu um espaço de eleição nos processos de internacionalização das nossas empresas. Queremos dar continuidade à dinâmica registada nos últimos anos.

Por outro lado, a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento deverá permitir que o espaço euro-americano se reafirme como um dos eixos mais importantes de inovação e crescimento. Creio também estarem reunidas as condições para dar um novo impulso ao processo negocial UE-Mercosul, que em muito beneficiará as nossas economias.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

Partilhamos com os Países Africanos de Língua Portuguesa largos séculos de história, uma profunda amizade e uma continuada cooperação. São relações, também elas, especiais, fundadas num vasto conhecimento recíproco e no respeito mútuo; relações que superam as mudanças conjunturais e que se reafirmam em momentos de desafios importantes.

É neste espírito que reiteramos o nosso empenho em intensificar as relações mutuamente benéficas com Angola e em aprofundar o relacionamento bilateral com Cabo Verde, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Procuraremos dinamizar o apoio internacional à Guiné-Bissau, esperando que ali se consolide a ordem constitucional.

Liga-me a África, como a tantos outros portugueses, a minha própria história pessoal, e foi com satisfação que constatei, ao longo destes anos, a renovação do interesse por aquele continente. Reforçámos, de resto, o relacionamento com outras nações da África subsariana, como o Senegal e a Costa do Marfim – mas será preciso fazer mais, quer a nível bilateral, quer a nível regional.

Sublinho, também, como exemplo positivo, o empenho que Portugal vem colocando na coordenação internacional para a segurança no Golfo da Guiné, procurando contribuir para a capacitação dos Estados e das organizações da região. Cabe-nos, em 2016, a Presidência do “Grupo alargado do G7 dos Amigos do Golfo da Guiné”.

À Ásia nos ligam, igualmente, a História, os afetos e a língua. A importância económica e estratégica deste continente convida-nos a redobrar os esforços para que se mantenham fortes as pontes que fomos construindo.

Colocámos num novo patamar o relacionamento político, económico e empresarial com vários países asiáticos; estabelecemos uma dinâmica recíproca de interesse pelos respetivos mercados e destinos de investimento; estimulámos a colaboração ao nível académico e da investigação.

Permaneceremos, naturalmente, muito empenhados no aprofundamento da nossa ligação especial a Timor-Leste. E há, na região, ainda muito espaço para crescer, dando conteúdo presente a laços históricos como os que se assinalam neste ano: 500 anos de amizade com países como o Vietname e o Bangladesh.

O relacionamento entre Portugal e a China vem assumindo, por seu turno, um caráter estratégico, continuando os dois países apostados em expandir as áreas de cooperação bilateral. A visita que ali efetuei, em 2014, foi assumidamente marcante e esperamos que os contactos políticos ao mais alto nível se repitam com regularidade.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

Na nossa vizinhança sul, a ameaça do Daesh e de outros grupos terroristas está no topo das nossas preocupações. O combate a este fenómeno deve focar-se também nas fontes de financiamento e nos instrumentos de promoção do radicalismo islâmico e de recrutamento de novos elementos. É necessária uma forte cooperação com os países mais afetados pelo terrorismo, nomeadamente no Médio Oriente e norte de África.

Acompanharemos de muito perto a situação em áreas de conflito como a Líbia, a Síria, o Iraque ou o Iémen, esperando que os esforços de diálogo em curso possam criar as bases para a desejada pacificação. É necessário o espírito de abertura de todos os atores para que se procurem efetivas soluções de paz.

Lembro que o Prémio Nobel da Paz de 2015 reconheceu o mérito e a ação decisiva do Quarteto para o Diálogo Nacional na Tunísia para a construção pacífica de uma democracia plural neste país. Renovo a minha saudação ao Governo tunisino por este prémio, um exemplo inspirador para todos.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

Não poderia, naturalmente, deixar de referir as visitas a Portugal, em 2015, dos Chefes de Estado de Moçambique, Senegal, Bulgária e Irlanda, as quais se afirmaram como testemunho de um estreito relacionamento bilateral. Vale a pena lembrar que as Visitas de Estado são o mais elevado sinal de empenho mútuo num diálogo franco e estruturado.

O tempo que vivemos é cada vez mais rápido na circulação da informação e na exigência de respostas. Mas não devemos perder de vista a necessidade de dar tempo ao diálogo, ao paciente labor da diplomacia.

Disso foram exemplo a adoção da nova Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e as negociações sobre o ambiente e as alterações climáticas. Em Paris, 195 países adotaram um Acordo global e vinculativo para salvar o nosso planeta, um ponto de partida para uma nova etapa no combate às alterações climáticas. Congratulo-me com estas demonstrações de que é possível delinear respostas globais a problemas que também o são. Mas o nosso trabalho começa, verdadeiramente, agora.

Do mesmo modo, os assinaláveis progressos no acordo de paz na Colômbia vieram comprovar o quão importante é a disponibilidade política para o diálogo e a procura negociada de soluções. Portugal sabe-o e arrisco dizer que de há muito que o sabe. Somos, afinal, uma Nação que, desde cedo, se abriu à diversidade dos povos e enriqueceu o Mundo com a sua capacidade para promover o diálogo e a confluência de diferentes culturas.

Os desafios que temos pela frente são, como já referi, de uma enorme dimensão, gravidade e premência. Mas temos alguns sinais de que é possível trabalhar em conjunto para lhes fazer face; sinais que nos dão acrescido alento para nos empenharmos em que 2016 seja efetivamente um ano de renovada esperança, paz e prosperidade.

São estes os votos que uma vez mais vos deixo.

Muito obrigado.