Mensagem do Presidente da República dirigida à Conferência “As Instituições Financeiras e o Desenvolvimento do Microcrédito”, promovida pela Associação Nacional de Direito ao Crédito

Na impossibilidade de estar presente nesta Sessão de Abertura da Conferência sobre as “Instituições Financeiras e o Desenvolvimento do Microcrédito”, quero por este meio expressar a todos os presentes o apreço por esta iniciativa e a esperança que deposito no vosso trabalho. Acredito firmemente no potencial de mudança que o Microcrédito representa para vastos sectores da sociedade portuguesa, ainda fortemente marcada por desigualdades, escassez de oportunidades e por situações de exclusão social que não nos podem deixar indiferentes.

Elegi como uma das prioridades deste meu mandato como Presidente da República o de lançar as bases de um compromisso cívico para a inclusão social que permita conferir maior sustentabilidade e eficácia aos esforços públicos e privados que visam superar esses problemas sociais.

Ao fazê-lo, tinha consciência dos desafios e bloqueios que esses problemas colocam ao desenvolvimento de uma sociedade mais justa e mais equitativa que não exclua um elevado número de portugueses dos benefícios da criação de riqueza e do crescimento económico.

Tinha também a certeza de que o esforço necessário para concretizar essa ambição não poderia continuar a centrar-se na iniciativa do Estado, nos sistemas de protecção social, nas políticas tradicionais de redistribuição do rendimento ou na acção caritativa e assistencialista.

Entendo que este combate diz respeito a todos, que urge apelar à responsabilidade cívica e social de todos os portugueses, quer individualmente quer através das empresas e organizações de cidadãos, no sentido de contribuírem com a sua parte, por mais ínfima que seja, para este desígnio nacional de construirmos uma sociedade socialmente mais justa e mais coesa.

Tenho também defendido que esse esforço e esse compromisso só vingará se alterarmos o sentido das políticas sociais e a filosofia subjacente aos modelos que sustentam o sector social.

Quando falamos de pobres e de excluídos, estamos a falar de pessoas, de cidadãos que privados das condições mínimas de sobrevivência, dignidade e de integração na vida colectiva, a quem não pode ser recusado o direito de demonstrarem do que são capazes e de construir um projecto de vida que os devolva ao estatuto pleno de cidadania.

É fundamental olharmos para essas pessoas como um potencial de criação de riqueza, de participação activa na vida da sociedade e de serem eles próprios os actores principais do seu processo de inclusão.

Por isso, falamos de uma nova geração de políticas sociais, assentes no princípio da inclusão activa, onde tão importante como um subsídio ou uma doação é a possibilidade de aceder a uma oportunidade de partilhar o processo de criação de riqueza e de participação activa e responsável na construção de uma sociedade de mais bem-estar e progresso.

O legado fundamental de Mohammed Yunus, através da bem sucedida experiência do Banco Grameen e da difusão global do Microcrédito, é precisamente o seu contributo para passar de um modelo de sustentabilidade do sector social, tradicionalmente identificado com a economia do dom e da dependência pessoal, para um modelo que cria oportunidades, desenvolve negócios, cria emprego e desencadeia novas lógicas de apropriação e distribuição de rendimento.

Sendo uma solução de elevado potencial de inclusão é também uma via que permite encontrar respostas mais ágeis e mais eficazes para as situações de desemprego, de dificuldade de integração no mercado de trabalho, de dignificação do contributo dos socialmente excluídos, de promoção de uma cultura de iniciativa e empreendedorismo que tanto falta na sociedade portuguesa.

Como Presidente da República e como cidadão quero expressar vivamente o meu reconhecimento e incentivo à Associação Nacional de Direito ao Crédito, às instituições financeiras associadas a este projecto e às organizações públicas e privadas que contribuem para que esta quase utopia se transforme, dia a dia, numa experiência de sucesso e num futuro cada vez mais promissor para muitos Portugueses. 

Aníbal Cavaco Silva

21.11.2007